Com qual filme pode se comparar q mitologua norte amerindia

Mesmo durante um ano tão desafiador quanto 2020, outubro é sinônimo de Halloween. O terror nas telas pode não se comparar ao da vida real, mas se há algo que as obras do gênero são capazes de fazer é reunir as pessoas para se assustarem (mesmo que a distância).

Desde 2019, o Omelete tem uma "tradição" para o mês das bruxas: uma lista de 31 itens temáticos, atualizada todos os dias de outubro. Ano passado foram Os 31 Filmes Essenciais de Terror, e agora é a vez de 31 Cenas Icônicas de Filmes de Terror!

Durante todo o mês de outubro, atualizamos essa página com uma nova cena por dia, com explicações do que as tornam tão assustadoras ou marcantes para o gênero. Mesmo com a lista fechada, é altamente encorajada discussões e sugestões nos comentários!

Halloween (2018)
Dir.: David Gordon Green

Disponível para streaming no Amazon Prime Video

No Dia das Bruxas, não há outro alternativa que não Halloween. A franquia clássica de John Carpenter deu um ícone para a celebração e, assim como fizemos na lista de 31 Filmes Essenciais de Terror, nada mais justo do que celebrá-lo no dia correto.

Sucessor espiritual do clássico de 1978, Halloween (2018) é repleto de momentos marcantes. O filme inteiro é construído em ousadas cenas de violência, mas uma se destaca pelo simbolismo. Logo no primeiro ato, Michael Meyers escapa da prisão onde passou os últimos 40 anos, e planeja se vingar de Laurie Strode (Jamie Lee Curtis). Mas há algo faltando. Michael Myers não é ninguém seu sua máscara.

A cena é conduzida pela perspectiva dos jornalistas Dana (Rhian Ress) e Aaron (Jefferson Hall). Os dois param em um posto de gasolina, para abastecer e ir ao banheiro, mas logo algo de errado acontece. No banheiro, Dana percebe a presença de alguém, que vai abrindo todos as cabines, como se procurando algo. Já Aaron repara que tudo está quieto demais e, ao investigar, descobre que os funcionários do local foram assassinos. A violência toma conta, e Myers ataca a cabine de Dana, que tenta rastejar por sua vida.

A sequência toda é de embrulhar o estômago com tensão, violência e a frenética trilha de John Carpenter. Mas, depois que os dois são assassinados, o público é recompensado com um momento bastante emblemático: o serial killer se reencontrando com sua máscara. A cena demonstra que, mesmo 40 anos após nos assustar pela primeira vez, a expressão vazia da Forma que assombra Laurie Strode ainda é capaz de nos horrorizar também. Quando se trata de filmes de terror, Halloween é a definição de icônico.

O Massacre da Serra-Elétrica (1974)
Dir.: Tobe Hooper
Disponível para streaming na Darkflix e no Looke

Precursor dos slasher, O Massacre da Serra-Elétrica é um filme sujo e impiedoso. O clássico do falecido Tobe Hooper mergulha no interior dos Estados Unidos com sobriedade assustadora, e retrata uma família de degenerados cometendo crimes com chocante violência.

A cena da nossa lista, então, não poderia ser outra que não o momento mais catártico da obra. Ao longo de toda a jornada, o grupo de jovens viajantes é eliminado um-por-um, de formas brutais, pelas mãos de Leatherface e sua serra-elétrica. Sally (Marilyn Burns) é a única sobrevivente, mas por pouco.

Após tanta violência, os momentos finais mostram a garota fugindo do insano Leatherface, mancando rumo à uma estrada deserta enquanto é perseguida pelo maníaco de serra-elétrica. Quando seu fim parece iminente, uma pick-up salva a jovem das garras do vilão, e o carro dirige para longe enquanto o monstro dança loucamente. Não só é a cena mais memorável da franquia, como também fecha o clássico com chave de ouro: com o alívio de ter sobrevivido ao horror inimaginável.

O Exorcista (1973)
Dir.: William Friedkin
Disponível para compra/aluguel no Apple TV, Google Play e Looke.

Chegou a vez do grande clássico O Exorcista (não, claro que ele não ia ficar de fora) e, assim como O Iluminado, nos vemos novamente em um pepino. Como escolher apenas uma cena de um filme que deixou um legado gigante de momentos históricos? A virada de cabeça, a cama chacoalhando, a cena do engatinhado na escada, o rosto branco momentâneo, o crucifixo, o vômito, e por aí vai. Mas, porque a lista precisa se justificar e ninguém é exceção, selecionamos, mas fizemos de maneira quase abrangente - De O Exorcista, escolhemos a cena do exorcismo.

Antes de mudar os filmes de possessão demoníaca para sempre, e se tornar a maior bilheteria de filmes para maiores de idade (ajustada para a inflação), O Exorcista chocou o público nas seletas salas de cinema em que foi exibido inicialmente, por conta de suas cenas fortes. Mas o longa de William Friedkin passa quase sua duração inteira preparando o solo para o clímax de seu grand finale, que dura aproximadamente 10 minutos.

Quando os padres Merrin e Karras se unem para tentar expelir o demônio de Reagan, a entidade se torna muito mais ameaçadora, e Friedkin se utiliza do momento para criar um visual arrebatador. O exorcismo ficou marcado para sempre não apenas por tornar icônica a frase "o poder de Cristo o compele", ou pela própria cena em que Reagan vira a cabeça, mas pelas cenas muito bem filmadas, como a garota flutuando ou iluminada por trás, em uma cena totalmente assustadora e surreal.

Abismo do Medo (2005) 
Dir.: Neil Marshall
Lançado em DVD no Brasil pela Califórnia Filmes

É curioso que, apesar de ser uma peça fundamental do terror, principalmente hoje em dia, poucos itens da nossa lista de cenas icônicas relembram um jumpscare específico. Isso talvez seja porque poucos filmes conseguiram construir um destes momentos tão perfeitamente quanto Abismo do Medo. Lançado em 2005, o filme britânico foi aclamado por sua atmosfera claustrofóbica, e foca em cinco amigas que se perdem no meio de uma exploração de uma caverna misteriosa. Não demora para que as jovens percebam que não estão sozinhas, e estão sendo perseguidas por criaturas humanoides assustadoras.

Quem viu Abismo do Medo sabe: a cena inesquecível deste terror acontece quando temos a primeira boa visão da ameaça, em uma cena iluminada por luz negra. As amigas estão gritando em pânico em um escuro absoluto, até que a câmera vira e revela o formato e aparência da bizarra criatura. A partir daí, Abismo do Medo não sossega, entregando toda sua reta final para os fortes do coração.

Ju-On: O Grito (2002)
Dir.: Takashi Shimizu
Atualmente indisponível em plataformas digitais no Brasil

Enquanto o terror norte-americano passava por uma crise no começo dos anos 2000, o cinema japonês de gênero conquistou seu espaço com obras altamente originais e macabras. O Grito talvez seja a mais memorável delas. A criação que Takashi Shimizu cultiva, atualiza e expande desde os anos 1990 levou ao mundo todo os horrores da mitologia nipônica.

Por mais que cada um dos 13 filmes tenha tramas e personagens próprios, a franquia gira em torno da ideia de que, quando alguém é vítima de um crime violento, as almas passam a assombrar os lugares em que morreram. É um eterno ciclo de medo, dor e angústia, uma marca sangrenta do passado. No primeiro longa cinematográfico da franquia, lançado no Japão em 2002, isso se manifesta através de fantasmas que caçam várias pessoas que violam a casa em que foram assassinados.

Assim como em toda boa obra que lida com espectros do além, os espíritos - o garoto Toshi e sua mãe, Kayako - primeiro atormentam suas vítimas com alucinações e aparições que desafiam a lógica. Quando Kayako enfim se revela para a assistente social Rika (Megumi Okina), faz com uma entrada de peso ao descer as escadas com seu corpo contorcido, chorando sangue. O momento, que evoca uma cena de O Exorcista, é marcado pelo visual horrendo da criatura, e pelos seus tenebrosos ruídos. Se passamos o começo dos anos 2000 aterrorizados por moças fantasmas de cabelos pretos, a cena - refeita com mesmo nível de tensão por Shimizu na versão estadunidense de 2004 - é uma das grandes responsáveis pelos pesadelos.

A Hora do Pesadelo (1984)
Dir.: Wes Craven
Disponível para compra/aluguel na Microsoft Store.

Uma das coisas mais admiráveis de A Hora do Pesadelo é ver a criatividade de Wes Craven ao brincar com os limites da realidade e os efeitos dos sonhos mortais com Freddy Krueger. Lançado em 1984, o terror consolidou as regras do slasher da época e adicionou ao gênero um estilo e uma premissa absolutamente únicas, sobre a assombração que persegue adolescentes - e principalmente a nossa protagonista, Nancy (Heather Langenkamp).

Se tem uma coisa que chama atenção em A Hora do Pesadelo é a persistência e inventividade de Nancy e, em contraste, a total falta de noção de seus amigos - mais particularmente talvez, a de Glen, seu namorado (mais conhecido como Johnny Depp em seu primeiro papel no cinema). Completamente desatento aos perigos que Freddy Krueger representa, Glen não toma todas as precauções e diversas vezes cai no sono, até uma noite fatídica em que isso representa o seu fim.

Mas Craven não faz esse momento passar barato: a cena da morte de Glen não somente é simbólica como é linda de ver. O jovem é sugado para dentro da cama com tudo que tem direito, som, tv, e tudo mais, capturado pelas garras de Krueger. Para completar um momento lindíssimo do terror, Craven banha a tela de sangue com um jato que flui de cabeça para baixo (filmado, claro, com o quarto invertido). 

Corrente do Mal (2014)
Dir.: David Robert Mitchell
Disponível em streaming no Telecine Play, Prime Video e Globoplay. 

A ideia de que uma ameaça virá atrás de você, independente de onde você esteja, e não há nada que você possa fazer para impedi-la é amedrontadora. Apesar de diversos filmes de terror usarem o conceito - em assassinos persistentes como Michael Myers ou a inevitabilidade do destino em Premonição - ninguém se utilizou tão bem dessa essência quanto David Robert Mitchell em Corrente do Mal. No longa de 2014, Jay é perseguida por uma entidade - manifestada na forma de um ser humano - que é passada através do sexo, e enquanto tenta entender o que lhe acontece e maneiras de evitá-la, ela e um grupo de amigos tenta ganhar tempo e escapar do ser o máximo posível.

Existem diversas cenas geniais em Corrente do Mal: desde mais assustadoras, como a chegada do homem alto, ou onde a escalada de suspense é discreta e gigante, em qualquer momento de Mitchell filma um campo aberto, e qualquer pessoa parece ameaçadora por estar vindo na direção da câmera. Mas a cena mais icônica do longa está no início, quando Jay é "infectada" pela corrente: seu transmissor a amarra em uma cadeira de rodas para lhe mostrar a veracidade dos bizarros acontecimentos, e como isso funciona. Cheia de tensão e com uma câmera desconfortável, a cena da cadeira de rodas em Corrente do Mal captura perfeitamente o terror de sua premissa, antes de desenvolvê-la em um excelente terror.

Jogos Mortais (2004)
Dir.: James Wan
Indisponível para streaming no território brasileiro

Jogos Mortais foi um daqueles filmes que surpreendeu a todos quando saiu no cinema. Um sucesso absoluto de bilheteria (o longa arrecadou US$ 103 milhões para um orçamento de US$ 1,2 milhões) o primeiro filme da franquia foi o responsável por uma nova leva de filmes de terror, que se distancia do suspense predominante das produções da época e vai direto ao ponto - mais precisamente, ao torture porn. Mas o filme surpreendeu mais do que pela sua produção barata e trama simples: ele tem um dos twists mais memoráveis do cinema recente.

A premissa é básica: dois estranhos acordam em um ambiente desconhecido, com um cadáver ao lado, e alguns elementos que os auxiliam a retomar os estranhos acontecimentos que os levaram ali. Enquanto os dois tentam escapar da situação sufocante, o filme também acompanha a história do detetive que vai atrás do responsável pelos atos bizarros.

Jogos Mortais hoje é relembrado por suas inúmeras sequências e por ter sido o projeto que lançou a carreira de James Wan com Leigh Whannell, mas quem viu o filme certamente não esqueceu a grande reviravolta final de Jogos Mortais. O momento em que o morto levanta e surpreende o protagonista por estar vivo desde o começo é um dos melhores twists do terror, exatamente por ser tão imprevisível. A situação é tão absurda, e há tanta trama para desemaranhar, que ninguém suspeitava que o maior suspeito estava diante de nossos olhos. 

Evil Dead II (1987)
Dir.: Sam Raimi
Disponível para compra/aluguel digital no Google Play, Microsoft Store e Apple TV

Há 61 anos, em 23 de outubro de 1959, nascia Sam Raimi. Algumas décadas depois, em 1981, seu nome se tornaria um dos mais marcantes do cinema de horror por Evil Dead (ou Uma Noite Alucinante: A Morte do Demônio). Sangrento, sádico e muito divertido, o clássico cult é uma produção amadora de ambição colossal, capaz até de conquistar Stephen King pela inventividade e personalidade. Cada fã da saga, que já teve reboot e até série de TV, gosta por motivos diferentes, mas parece existir um consenso de que o ponto alto é justamente a sequência ao original.

Lançado seis anos após o primeiro virar cult, Evil Dead II deu a oportunidade de Raimi usar seus recém-adquiridos cheques para refazer a premissa do original. Saem os personagens secundários, o que dá mais foco ao herói desastrado Ash Williams (Bruce Campbell, amigo de infância do diretor). Os minutos iniciais recontam todo os acontecimentos do antecessor, mas a segunda metade não poderia ser mais diferente, com Ash comprando briga com o mal ancestral que despertou. E apanhando muito, mas muito no processo.

Na verdade, muito do apelo de Evil Dead II talvez esteja em o quanto Ash apanha dos demônios. A cena escolhida não é diferente. Ao caçar sua mão decepada possuída (longa história), o protagonista acidentalmente deixa vários buracos de escopeta na parede. A perseguição parece ter acabado quando um dos furos começa a sangrar, e Ash acredita ter acertado… até que os buracos passam a jorrar litros e litros de sangue, quase como um gorfo sobrenatural, que rapidamente se recolhe para as paredes. Se a situação não fosse ilógica o bastante, a cabana parece ser possuída por um riso contagiante, com os objetos e móveis debochando do horror enfrentado pelo protagonista.

Não há momento que melhor sintetize o estilo único de Sam Raimi. Em questão de minutos, o espectador é exposto ao bizarro, ao sangue incessante e, de repente, ao humor pastelão, praticamente saído de um desenho matinal. Ash ri junto até perceber que ele é a piada. É um momento de pura insanidade, diversão e horror que, até hoje, quase ninguém além do cineasta sabe conduzir com tamanha maestria.

Psicose (1960)
Dir.: Alfred Hitchcock
Disponível para streaming na Netflix, Telecine Play e Claro Video, e para compra/aluguel digital no Looke e Apple TV

Alfred Hitchcock não ganhou o título de “mestre do suspense” à toa. O cineasta levou uma carreira dedicada ao mistério, crime e estranheza, sempre experimentando formas de levar a linguagem cinematográfica adiante. O melhor exemplo disso é sua obra-prima Psicose, um verdadeiro precursor do terror slasher que viria a dominar as telonas nas décadas seguintes.

Não existe cena mais icônica no terror do que o assassinato de Marion Crane (Janet Leigh) no chuveiro. O momento é conduzido com perfeição, pega o espectador de surpresa e muda completamente o rumo do filme. Mas esse não é a única cena perfeita de Psicose. A conclusão não tem o crédito que merece.

É certo que, após as várias reviravoltas que revelam Norman Bates (Anthony Perkins) como um assassino, Hitchcock toma uma caminho bastante explicativo para deixar o espectador a par do transtorno de personalidade do vilão. Mesmo assim, nos segundos finais do thriller, o diretor retoma o clima de tensão e ansiedade ao mostrar Bates, em completo controle, tramando algo perverso.

Mesmo detido na cadeia, Norman Bates é atormentado pelas vozes de sua mãe. Surge um macabro sorriso enquanto a câmera fecha em seu rosto. Há um contraste irônico entre o texto explicativo e a atuação sóbria e sombria de Perkins. E uma coisa é certa: é impossível não sair do cinema sem se sentir desconfortável depois de um final desses, que deixa a mente do espectador esperando pelo pior.

Fome Animal (1992)
Dir.: Peter Jackson
Atualmente indisponível nas platafomas digitais brasileiras
Texto por Gabriel Ávila

Há quem diga que Fome Animal não é terror, já que o filme está mais ligado à comédia e à ação. Curiosamente esse é um argumento verdadeiro e equivocado ao mesmo tempo. Existe sim humor e pancadaria, da mesma forma que há romance, stop-motion e até uma leve piscada para os filmes de monstro - mas isso não significa que Fome Animal não seja terror. Só quer dizer que essa é uma obra completa que cobre vários gêneros com louvor e muito sangue.

O trabalho de Peter Jackson (O Senhor dos Anéis) nesse clássico trash é exemplar. Ele mistura uma série de clichês e referências dando luz a uma experiência poucas vezes encontrada no cinema. Não precisa sacar as homenagens a clássicos como Psicose, Sexta-Feira 13 e até King Kong para apreciar o filme, mas esse tipo de curiosidade certamente faz até mesmo o cinéfilo mais enjoado reconhecer que o sucesso de Fome Animal não foi um mero golpe de sorte.

O filme conta a história de Lionel Cosgrove (Timothy Balme), um jovem que tenta viver um romance com a bela Paquita (Diana Peñalver) às escondidas de sua mãe controladora (Elizabeth Moody). Em um inocente passeio no zoológico, a senhora Cosgrove é mordida pelo maligno Macaco-Rato da Sumatra, sendo infectada com uma doença mortal que dá início a um apocalipse zumbi.

A espiral de loucura e nojeira iniciada pela infecção da mãe de Lionel propicia os eventos mais absurdos e hilários, com direito a um padre porradeiro (que chuta bundas pelo senhor) e um bebê zumbi asqueroso. A insanidade vai escalonando até o clímax do filme, em que o nosso herói se livra dos zumbis com o auxílio de um cortador de grama. Considerando que só para essa cena foram gastos mais de 300 litros de sangue falso, é justo dizer que esse é um marco do gore no cinema. Que bom seria se Peter Jackson, após se consagrar com a excelente trilogia O Senhor dos Anéis, deixasse a megalomania de revisitar a sua obra-prima com orçamento obsceno (e qualidade questionável) e voltasse a fazer esse cinema moleque que a gente tanto gosta, não?

O Orfanato (2007)
Dir.: J.A Bayona
Disponível para compra/aluguel digital no Now.

Lá em 2007, J.A Bayona ainda não tinha se tornado o diretor de Jurassic Park e nem dirigido O Impossível, mas fazia sua estreia com um dos melhores filmes de terror de sua época, o espanhol O Orfanato. Trazendo a produção de Guillermo Del Toro, esse terror sobrenatural tem um carisma e uma energia absolutamente únicas, que não apenas capturou os críticos da época como recebeu uma ovação de 10 minutos em sua estreia no Festival de Cannes. É para poucos.

O Orfanato conta a história de Laura, uma mulher que se muda com sua família para o orfanato onde viveu sua infância, mas no meio dos planos de renovação da residência, seu filho pequeno desaparece. O filme se desenvolve na procura de Laura por Simon e os estranhos acontecimentos que se desenrolam no casarão, que incluem (claro) um amigo imaginário sinistro, a desconfiança certeira da protagonista, um marido impaciente e por aí vai. Mas o que O Orfanato tem de especial é que ele não soa como um clichê em nenhum momento, e sabe se prolongar em cenas e sentimentos fugindo totalmente do clima de terror convencional.

Um dos momentos em que isso fica mais visível é quando o filme atinge o seu clímax e Laura decide testar uma teoria um tanto suspeita de que a casa está repleta de espíritos de crianças. Depois de criar um ambiente amigável para receber as entidades, arrumar suas camas, servir um jantar, ela começa um jogo de esconde-esconde sozinha. Mas não fica assim por muito tempo. A tensão da cena escala enquanto Bayona filma o momento em uma sequência só, acompanhando a crescente expectativa e medo de Laura. A cena exemplifica todo a excelência de Orfanato, certamente um dos filmes mais emocionantes e poéticos da nossa lista.

It: A Coisa (2017)
Dir.: Andy Muschietti
Disponível para streaming na Netflix e no Now, e para compra/aluguel digital no Google Play, Microsoft Store, Looke e Apple TV

Enquanto a minissérie protagonizada por Tim Curry caiu nas graças dos fãs de terror, a adaptação mais recente de It, livro de Stephen King, é um verdadeiro fenômeno do horror. O filme fez uma impressionante bilheteria mundial de US$700 milhões, e não por falta de mérito ao combinar boas doses de humor com sustos e assombrações.

Praticamente toda cena com o palhaço Pennywise de Bill Skarsgard é memorável, mas nada bate a abertura do filme. Nos primeiros momentos, somos apresentados a Georgie (Jackson Robert Scott), um garoto inocente que quer brincar de barco durante um dia de chuva. Seu irmão mais velho, Bill (Jaeden Martell), não se sente disposto para sair, e deixa o menino ir brincar sozinho. Durante o toró, Georgie vê seu barquinho levado pela “correnteza” até cair em um buraco. Quando se deita para procurar o brinquedo, ele é confrontado por Pennywise, que tenta iludir o menino com promessas de amizade.

Neste primeiro momento, em que o filme ainda não demonstrou seu lado cômico, a cena pesa bastante. A fofura de Georgie faz contraste direto com a monstruosidade perturbadora de Pennywise. O momento não só demonstra que It sabe ser horripilante quando quer, como também demonstra a força da desconcertante atuação de Skarsgard. A cena acaba com o palhaço devorando - explicitamente - o braço de Georgie, e assim as desventuras do Clube dos Perdedores, que dura muitas décadas após, têm seu início.

O Chamado (2002)
Dir.: Gore Verbinski
Disponível para compra e aluguel no Google Play, Claro Video e Apple TV. 

Seria difícil imaginar a primeira década dos anos 2000 sem a sua leva de remakes americanos de filmes japoneses como O Grito, Água Negra ou O Olho do Mal, mas o grande responsável por essa fase do cinema é, também, o melhor do grupo: O Chamado. Em 2002, a versão americana de Ring (1998) introduziu ao mainstream um tipo de terror bizarro que entraria para a moda, um que confia muito mais em imagens horripilantes e bizarras do que no gore propriamente dito.

Quem poderia esquecer da fita de O Chamado e sua icônica protagonista, Samara? E enquanto a sequência do VHS é certamente seu momento mais instantaneamente memorável, escolhemos uma cena que une o clássico com o surpreendente: quando a sinistra garota ultrapassa os limites de seu universo e entra para o nosso, saindo da televisão para matar suas vítimas de puro medo.

O visual frio de O Chamado já seria admirável por si só, mas a cena em que Samara transita entre os mundos é especialmente bem feita. Acompanhada por uma trilha sonora de ninguém menos que Hans Zimmer, a imagem da garota se arrastando para fora da TV (mas mantendo seu visual de VHS) é o momento mais marcante do longa de Gore Verbinski, e o mais difícil de esquecer.

O Homem Invisível (2020)
Dir.: Leigh Whannell
Disponível para streaming no NOW, e para compra/aluguel digital no Google Play, Looke, Claro Video e Apple TV

2020 não só está escasso de bons filmes nos cinemas, mas também de bons filmes de terror num geral. Como pouco mais de dois meses pela frente, já é possível definir a modernização de O Homem Invisível, clássico da Universal Pictures, como um dos poucos destaques do gênero neste ano. O filme, é claro, também é cheio de mérito.

O diretor Leigh Whannell, colaborador de longa data de James Wan, imagina o clássico conto através da perspectiva da vítima do titular homem invisível. O horror vem de acompanhar Cecilia (Elisabeth Moss) ser tratada como louca enquanto seu ex-marido abusivo, Adrian (Oliver Jackson-Cohen, de Residência Hill e Mansão Bly), a persegue impiedosamente. Whannell é mestre em construir a tensão apenas com espaços vazios, mas também em comandar cenas de ação, especialmente após desenvolver sua técnica em Upgrade (2018).

Terror e ação se combinam na cena escolhida. Após diversas provocações de Adrian, Cecilia acredita que seu ex-marido forjou um suicidio, desenvolveu uma forma de se tornar invisível e a encontrou. Suas suspeitas são violentamente confirmadas quando a mulher é atacada durante a noite, e precisa fazer de tudo para sobreviver. O momento não só deixa explícito ao espectador que o perigo não é fruto da imaginação da protagonista, como também conquista pela simplicidade em que é rodado. Combinando uma roupa verde, alguns cabos e planos longos, Whannell junta o melhor da computação gráfica com os confiáveis efeitos práticos, em uma cena que dá um gostinho do quão investida fisicamente Elisabeth Moss está no papel. Num ano com tão poucos filmes de peso, O Homem Invisível - e seu making-of - é indicação garantida, ao ponto de conseguir relançar todo o universo de monstros da Universal em uma fração do orçamento do fracassado A Múmia (2016)

Christine, o Carro Assassino (1983)
Dir.: John Carpenter 
Disponível em streaming na HBO Go.

Christine - O Carro Assassino tem uma energia definitivamente diferente da maioria dos filmes da nossa lista. Divertido e descontraído, o filme que uniu a direção de John Carpenter com a história de Stephen King tem exatamente o resultado que você esperaria da combinação: um terror bem-construído, carismático e ligeiramente zombeteiro, envelopado pela marca surreal e diversas vezes vacilante de King. Christine é uma recomendação para quem quer um terror sem grande compromisso, mas que acaba recompensado com cenas inesquecíveis. 

Desde o início de Christine - O Carro Assassino estamos cientes que a personagem-título tem uma alma e vontade própria, mas o filme se desenvolve mostrando como o veículo afeta a vida de Arnie Cunningham, um jovem deslocado que ganha notoriedade aos poucos, quanto mais sua personalidade muda por conta do carro. E apesar de sempre sabermos que Christine é mais do que aparenta, o filme brilha forte quando ele apresenta isso diretamente pela primeira vez, na cena em que a máquina se concerta sozinha, diante dos nossos olhos e do protagonista. 

Depois de diversos acontecimentos inexplicáveis, Arnie conversa com o carro e confirma suas suspeitas quando Christine obedece seu comando e começa a se reparar sozinha lentamente. Filmada ao contrário (com o carro se amassando) e depois colocada em reverso, a cena mostra cada parte do carro desamassando aos poucos e retornando ao seu brilho original, criando uma cena deslumbrante de ver. 

À Meia Noite Levarei Sua Alma (1964)
Dir.: José Mojica Marins
Disponível para streaming no Belas Artes À La Carte, e gratuitamente no Looke e Youtube

2020 é um ano complicado por inúmeros fatores, como a pandemia do coronavírus, mas o entretenimento também teve suas várias tragédias. Para os fãs de terror foi a perda de José Mojica Marins, o Zé do Caixão, que faleceu na metade de fevereiro. O cineasta não só é conhecido por seu icônico personagem macabro, mas também por trazer o gênero do horror ao Brasil.

Essa criação veio na forma de À Meia Noite Levarei Seu Cadáver, um clássico do cinema de horror que merece destaque sempre que possível. A obra, lançada no mesmo ano do golpe militar no Brasil, não tem medo algum de provocar. Muito pelo contrário, é visível o enorme prazer que Mojica tinha em chocar seu público mais fraco de coração. A cena que melhor descreve o gosto do diretor pela polêmica acontece logo no início do longa.

Após interromper um funeral, o Zé do Caixão se senta para jantar com Lenita (Valéria Vasquez), sua mulher. O coveiro então se zanga ao perceber que não há carne em seu prato. O motivo? É Sexta-Feira Santa. “Do que me importa se é sexta-feira dos santos ou do demônio?”, se irrita. “Vou buscar o que eu quero, e nenhum carola vai intervir. Hoje eu como carne, nem que seja carne de gente”. Logo em seguida, Zé do Caixão aparece sentado em sua janela, se deliciando com um pedaço de carne enquanto assiste a procissão passar.

O momento é bastante emblemático do gosto pela profanidade de Mojica sempre fez questão de demonstrar em seus filmes. Pelo exagero de toda a situação, há também toques de humor sombrio característicos do cineasta. Se hoje em dia o Brasil tem uma sólida produção de horror, tudo se dá ao fato de que, há quase 60 anos, o Zé do Caixão deixou sua casa em pleno feriado religioso para praticar um pouco de blasfêmia.

Sinais (2002)
Dir.: M. Night Shyamalan
Disponível para streaming no Telecine Play.

Esse item vale especialmente para nós brasileiros. A cena em que o primeiro alien aparece em sua forma completa e em luz do dia em Sinais já seria icônica por si só, mas ela é ainda mais especial para a gente: além de termos todo suspense e susto que só M. Night Shyamalan é capaz de construir, tivemos a honra de sermos os anfitriões da festinha vista na tela, que como a âncora do jornal fala, se passa em Passo Fundo, Brasil.

A cena em questão acontece bem no meio do suspense de Shyamalan, quando já temos certeza da existência extraterrestre, mas ainda não vimos o ser em sua forma completa. Assistindo ao personagem de Joaquin Phoenix reagir aos acontecimentos mostrados na TV, ficamos exatamente como ele, com o olhar fixo na telinha. A cena de Shyamalan se desenvolve de modo certeiro; o vídeo se assemelha a um registro caseiro mas é construído de modo caótico até te dar um susto perfeito, seguido pelo tema marcante de James Newton Howard. Para quem é fã, é até difícil esquecer as palavras proferidas pelos presentes no vídeo: “Atrás da garagem, is behind!” (o motivo para o pequeno menino de Passo Fundo, Brasil falar inglês subitamente segue um mistério).

Sexto Sentido abriu as portas de Holywood para Shyamalan, mas Sinais foi o filme que representou de modo mais apropriado todas as suas características: longas sequências em silêncio, a importância de cores, questões de família, jovens deslocados e por aí vai. Sinais pode ter dividido opiniões, mas sua construção de suspense e carisma são inegáveis.

Enigma de Outro Mundo (1982)
Dir.: John Carpenter
Disponível para compra/aluguel digital na Apple TV e Looke

“Ninguém confia em ninguém mais, e estamos todos cansados. Não há nada mais que eu posso fazer, apenas esperar”. Depois de meses de quarentena durante a pandemia do coronavírus, as palavras do piloto MacReady (Kurt Russell) fazem mais sentido do que nunca, e também descrevem perfeitamente todo o conflito da obra-prima de John Carpenter. O clássico sci-fi vai tão fundo na paranóia dos tripulantes caçando um alienígena impostor capaz de se misturar entre eles, que até o espectador desconfia de todos.

Carpenter toca o suspense da forma mais agoniante o possível. Quando MacReady descobre que a criatura é vulnerável ao fogo. Ao invés de incendiar todos os seus colegas, o piloto parte para a solução diplomática, e reúne todos os suspeitos em uma sala. Cada um oferece uma amostra de sangue, e MacReady testa uma por uma com uma agulha flamejante. A cena tem menos de 10 minutos, mas passa a sensação de horas. A repetição entre aquecer a agulha, testar e passar o próximo constrói um clima de tensão sufocante, de deixar na ponta da cadeira.

Quando chega a hora da verdade, o filme não decepciona. Pelo contrário, dá uma virada de ação grotesca com incríveis efeitos práticos, corpos em chamas e o estranho grunhido monstruoso de algo que não pertence à este planeta.

Pânico (1996)
Dir.: Wes Craven 
Disponível para streaming no Telecine Play.

Entre os diversos filmes que figuram na nossa lista, não são tantos que entram com a sua cena de abertura. O primeiro que faz isso na nossa seleção é Pânico, que não apenas estabeleceu todas as suas tradições como deixou todo mundo surpreso com a sua marcante primeira cena. 

O início de Pânico, lançado em 1996, é simples. A personagem de Drew Barrymore recebe uma ligação supostamente por engano, que aos poucos vai se tornando cada vez mais ameaçadora. Desde o momento em que a voz da linha diz que "quer conhecer a pessoa para quem está olhando", o suspense só cresce, até se revelar um lindo slasher - que inclusive, foi responsável pelo revival do gênero nos anos 90. As ligações telefônicas de Pânico - sempre com a tradicional pergunta "qual é seu filme de terror favorito?" - são a maior marca da franquia.

Uma das coisas mais legais do primeiro Pânico é que o filme foi divulgado fortemente pela presença de Drew Barrymore, que estampava a capa do longa. Lá em 96, o público não fazia ideia de que a grande estrela do suspense seria, na realidade, sua primeira vítima.

Nós (2019)
Dir.: Jordan Peele
Disponível para streaming no Telecine Play, e para compra/aluguel digital no Google Play, Looke e Apple TV

Com um Oscar na conta, Corra! é consenso como o melhor filme de Jordan Peele. Mas isso não significa que Nós, seu sucessor, fique muito atrás, especialmente quando se trata de momentos memoráveis. 

O longa de 2019, com todas as suas viagens sobre sósias e mundos subterrâneos, deixa o comentário social em segundo plano para explorar a bizarrice. Muito do que torna o filme tão marcante é atuação excelente de Lupita Nyong’o em dois papéis distintos. Seja o primeiro encontro da família com suas cópias, ou então a briga entre as duas protagonistas, há muito divertimento na estranha mente de Peele.

Nenhuma cena, porém, conseguiu o status de “icônica” como a segunda cena de invasão domiciliar de Nós. Após os personagens principais conhecerem seus sósias, o filme corta para a casa do casal Kitty (Elisabeth Moss) e Josh Tyler (Tim Heidecker) e seus filhos. O que começa como uma noite comum, ao som de “Good Vibrations” dos Beach Boys, se torna um pesadelo quando a família é atacada pelos seus clones. Com a brilhante direção de Peele, a cena é invadida pela violência, deixando apenas uma Kitty ferida, engasgando no próprio sangue como última sobrevivente. Rastejando, ela tenta um recurso final como salvação, e aciona a assistente virtual: “Ophelia, liga para a polícia”. A robô entende errado, e começa a tocar “Fuck the Police”, da NWA. Nenhuma outra cena é capaz de representar em tão poucos minutos o humor, o sadismo e a genialidade de Jordan Peele como diretor de terror.  

O Iluminado (1980)

Dir.: Stanley Kubrick
Disponível para streaming no HBO Go e Now

Honestidade total: este foi um dos momentos mais difíceis de escolher da nossa lista. Que O Iluminado estaria entre os 31 filmes escolhidos era óbvio: mas por suas diversas sequências memoráveis, o difícil foi encontrar qual seria a mais apropriada entrada para a nossa lista. O Iluminado é relembrado por uma abertura belíssima, a aterrorizante cena da mulher na banheira, o momento clássico do sangue no elevador, a sequência do machado na porta que acabou até na capa do filme, ou até aquele final arrebatador. Mas se é preciso escolher uma, fomos com o momento em que Jack se transforma totalmente, que figura uma das frases que se tornaria icônica: "All work and no play makes Jack a dull boy", ou "Só trabalho, sem diversão, fazem de Jack um bobão". 

Além de ser o momento de virada para Jack - a partir daí o personagem de Jack Nicholson é simplesmente e abertamente insano - este é o ponto em que O Iluminado entra em sua reta final, com perseguições, sustos seu final emblemático. Quando Wendy se vê sozinha com a máquina de escrever de seu marido e resolve ver no que ele tanto trabalha, ela finalmente percebe que nada estava bem há algum tempo. Com Jack se aproximando aos poucos ao fundo, a cena também ganha pontos por se passar inteiramente na sala de trabalho de Jack, cujas janelas grandes e pé direito enorme ajudam a constituir uma das fotografias mais belas do terror. E se pudermos tomar a liberdade de ir um pouco além, essa cena só se encerra quando Wendy acerta Jack com um taco de baseball, o que inclui também uma intercalada rápida com a visão de Danny do salão inundado de sangue.

Assim como no resto do filme inteiro, o momento de O Iluminado não falha em nenhum aspecto. Shelley Duvall e Jack Nicholson dão um show de interpretação, e a escalada da música que acompanha a tensão da cena até seu fim são apenas alguns dos elementos inesquecíveis da sequência. 

Um Lugar Silencioso (2018)

Dir.: John Krasinski
Disponível para aluguel/compra digital no Google Play, Apple TV, Microsoft Store e Claro Video

A virada de John Krasinski (The Office) ao horror foi uma grata surpresa. Atuando ao lado de sua esposa, Emily Blunt, o ator se mostrou confiante na jornada dupla de na frente e atrás das câmeras. Um Lugar Silencioso, que tem sequência prevista para 2021, foi um enorme sucesso de público e crítica, e muito disso se deu pelo seu aterrorizante conceito de um mundo repleto de monstros atraídos pelo som. A ideia não só é boa no papel, como também foi muito bem usadas em momentos de alta tensão.

Na cena em questão, a mais memorável do filme, testa o limite da resistência do público. Quando a fazenda da família principal é invadida pelos monstros, Evelyn (Blunt), prestes a dar a luz, tenta se refugiar no porão da casa. Cambaleando devagar, ela desce as escadas sem perceber um prego exposto, e pisa no objeto de pés descalços. A situação toda é agonia pura para a personagem, que precisa passar por um momento tão doloroso sem um grito sequer. As coisas só pioram quando Evelyn ainda precisa encontrar um jeito de despistar as criaturas e, de alguma forma, parir sua criança em total silêncio. 

Um Lugar Silencioso pode ser um filme divisivo entre os fãs de terror, especialmente por pender mais para o lado da ação, mas são sequências como essa, com o espectador completamente imerso na luta pela sobrevivência das telas, em que o conceito demonstra todo o seu potencial.

O Bebê de Rosemary (1968)
Dir.: Roman Polanski
Disponível para streaming no Prime Video e Telecine Play.

Sequências de sonho são quase clichê em filmes de terror, principalmente quando elas terminam naquele jump scare e o protagonista acorda. Mas se há um filme do gênero que soube brincar muito bem com uma linha tênue entre sonho e realidade foi O Bebê de Rosemary, na sequência inesquecível do pesadelo com o Diabo.

O longa de 68 conta a história de um casal recém-chegado em um prédio de Manhattan, que vive importunado pelos seus vizinhos e tenta gerar seu primeiro filho. Rosemary, interpretada pela Mia Farrow, eventualmente engravida, pouco tempo depois de ter um sonho mais do que absurdo em que estava sendo estuprada pelo demônio.

O maravilhoso da sequência construída por Polanski é que ela não é recheada de sustos ou imagens fantasmagóricas, mas se desenvolve em uma narrativa totalmente surreal que se assemelha muito a um sonho convencional. Rosemary se vê em um barco, cercada por estranhos, em uma marola constante que aumenta até um tufão, quando se vê no centro de um ritual. A realidade e o sonho então se misturam, e Rosemary profere as inesquecíveis palavras: "isso não é nenhum sonho, isso está realmente acontecendo!"

O resto é história. Sonho ou não, as consequências da noite de Rosemary são muito reais, sejam um delírio pós-traumático ou uma gravidez realmente satânica. Mas o certo é que Polanski soube construir uma cena que deixa muita gente intrigada, tentando decifrar cada um de seus simbolismos.

Raw (2016)
Dir.: Julia Ducournau
Atualmente indisponível em plataformas de streaming brasileiras

Os franceses não pegam leve quando se trata de terror. Não é a toa que, dos anos 2000 para cá, o cinema de gênero de lá ficou conhecido pelo movimento New French Extremity. Seu maior representante, Martyrs (2009), entrou na nossa lista de Filmes Essenciais, e agora outro dá o ar de sua desgraça nas nossas cenas icônicas: Raw.

Mesmo premiado em Cannes, o filme de Julia Ducournau consegue ser ainda mais divisivo que A Bruxa, Hereditário e muitos outros do horror moderno. Muito disso se dá pela sua trama de descobrimento juvenil ser passada através de canibalismo. É uma experiência grotesca, mas intensamente marcante - e a cena em questão é, literalmente, o primeiro gostinho dessa insanidade toda.

Durante o trote de sua universidade, a jovem vegetariana Justine (Garance Miller) é forçada a comer carne pela primeira vez em sua vida, ao ingerir um pedaço cru de coelho. O ato não lhe agrada no começo, mas desperta algo animalesco. A cena escolhida é a consequência disso. Um acidente faz com que sua irmã, Alexia (Ella Rumpf), corte o dedo fora, e desmaie ao perceber seu erro. Justine surta e corre para buscar uma bolsa de gelo para preservar o pedaço decepado… quando é tomada pelos seus instintos, e come a carne da própria irmã.

O momento é o ponto de virada de um filme que só fica mais e mais pesado no estômago do espectador. Felizmente, a atuação de Miller, e a direção e o texto de Ducournau não deixam Raw ser apenas sadismo canibalístico, e sim um dos melhores exemplos da versatilidade do horror na última década.

A Bruxa (2015)
Dir.: Robert Eggers 
Disponível para compra/aluguel no Google Play, Apple TV e Looke.

Antes de mais nada, aviso de spoilers. Apesar de já termos falado da cena final de Carrie sem nenhuma censura - já que é uma das cenas mais conhecidas do terror - aqui é preciso avisar que quem ainda não viu A Bruxa pode sim levar spoilers na nossa cena escolhida. Por isso, se você ainda não viu a A Bruxa, não apenas pare de ler como, por favor, vá ver A Bruxa. 

O terror de Robert Eggers (em sua estreia na direção) é tão amado por nós que entrou na lista dos filmes de terror essenciais do ano passado, e também ganha sua vaga na nossa seleção de 2020. Aqui, o motivo é a sequência final do longa, em que Thomasin (Anya Taylor-Joy) se vê como última sobrevivente da família e confronta o bode Black Phillip. O momento, absolutamente surpreendente por causa da resposta sussurrante da criatura, foca apenas na expressão da atriz, deixando o que está acontecendo do outro lado para a nossa imaginação. Com a conclusão do pacto realizada, vemos a protagonista nua na floresta, se unindo a outras mulheres em um estado alucinante.

Toda a cena por si só já é bonita demais de ver, mas a sensação é mais chocante pela escalada de tensão que percorre durante todo o filme. A Bruxa é um filme calmo, quieto, sufocante e desconfortável, uma atmosfera que torna seu clímax final ainda mais admirável.

Um Lobisomem Americano em Londres (1981)
Dir.: John Landis
Disponível para streaming no Amazon Prime Video, e para compra/aluguel digital no Google Play, Apple TV e Microsoft Store

Talvez a ausência mais sentida da nossa lista de Essenciais, Um Lobisomem Americano em Londres é um clássico que mantém sua força quase 40 anos após sua estreia. Meio comédia, meio horror, John Landis entrega 100% de entretenimento com uma história grotesca e altamente divertida.

É um filme cheio de momentos memoráveis, seja pela criatura solta nas ruas de Londres, ou o protagonista sendo atormentado pelos cadáveres de todas as suas vítimas em uma ida ao cinema. Mas nenhum chega ao nível de desconforto e admiração da primeira transformação de David (David Naughton).

Vítima da maldição licantrópica, o rapaz descansa na sala de sua namorada quando é surpreendido pela luz do luar entrando por sua janela. O efeito é quase imediato: ele se joga ao chão, suando e gritando de dor, enquanto seu corpo se deforma para algo animalesco. Mesmo em 2020, em que universos espetaculares são criados inteiramente em computadores, a cena tem um efeito de repulsa, curiosidade e divertimento pela intensa transformação feita inteiramente em efeitos práticos. Obra do mestre Rick Baker, David ganha uma camada de pelos, mãos e pés alongados, e afiados dentes amarelados. Não é a toa que o maquiador repetiu sua parceria com John Landis a pedido de Michael Jackson no curta de “Thriller”, mas também conquistou um Oscar pelo seu trabalho em 1982. A transformação de Um Lobisomem Americano em Londres é um daqueles poucos casos em que assistir aos bastidores não estraga a magia. Pelo contrário, eleva seu amor pelo cinema.

Carrie (1976)
Dir.: Brian De Palma
Disponível para streaming no Telecine.

Carrie ficou para a história por diversos motivos. Considerada uma das melhores adaptações de histórias de Stephen King, o filme de 1976 de Brian De Palma tem diversas interpretações e significados, ótimas atuações, uma grande trilha sonora, mas... não é por nada disso que ele entra na nossa lista. Carrie figura aqui porque tem uma das mais emblemáticas cenas de terror da história: o banho de sangue no baile de formatura.

Por mais que De Palma tenha construído um suspense psicológico exemplar durante toda a duração de Carrie, o filme se tornou inesquecível muito por causa do momento em que nossa protagonista é vítima de uma brincadeira criminosa de seus colegas de escola. A cena, que é construída bem lentamente e quase em silêncio, cria uma expectativa aterrorizante até que a personagem de Sissy Spacek é finalmente atingida pelo balde de sangue de porco. Da expectativa até a reviravolta, em que Carrie decide se vingar de todos os presentes no baile, a sequência de formatura certamente entra para os melhores momentos da história do terror.

Hereditário (2018)
Dir.: Ari Aster
Disponível para streaming na HBO Go e Amazon Prime Video, e para compra/aluguel digital no Google Play e Apple TV

A segunda cena de jantar da lista, mas essa não poderia ser mais diferente da anterior. Se Alien - O Oitavo Passageiro usa o momento como um toque de violência gráfica em meio ao suspense, Hereditário desenvolve seu lado dramático após uma sequência traumática de gore. Spoilers do filme abaixo - então, por favor, pare o que você está fazendo e assista Hereditário se ainda não viu.

A cena acontece pouco após a brutal reviravolta, em que Charlie (Milly Shapiro) tem a cabeça decepada por um poste, por culpa do descaso de seu irmão, Peter (Alex Wolff). A tensão entre o garoto e sua mãe, Annie (Toni Collette), fica tão pesada que um simples jantar em família rapidamente se torna lavagem de roupa suja. Em um filme com decapitações, fantasmas, cultos e combustões espontâneas, seu momento mais memorável vem da profunda dor da mãe de uma família em colapso.

Entre os fãs de Hereditário, o momento se tornou tão icônico que inspirou até correntes recitando a explosão de honestidade de Annie. No fim das contas, a personagem é o coração de toda a trama do filme, e Toni Collette tem a força de demonstrar isso com intensidade em uma única cena mundana.

A Profecia (1976)
Dir.: Richard Donner
Indisponível para streaming no Brasil. 

Alien não apenas é considerado um dos grandes clássicos do terror como, claro, figurou na nossa lista do ano passado de filmes essenciais do gênero, fazendo com que sua passagem pela nossa lista de 2020 não seja nenhuma surpresa. A nossa segunda escolha, no entanto, não passou pela lista anterior. A Profecia, apesar de ter ganho um certo status cult com o passar do tempo, é um caso bem diferente, que na época de lançamento foi recebido de forma mista pela crítica e público.

O longa de 1976, no entanto, certamente marcou seu tempo, e deixou como legado algumas cenas inesquecíveis. Foi até difícil escolher uma só, já que o primeiro grande filme de Richard Donner (que depois foi dirigir Superman e Goonies) tem mais de um momento de suspense absoluto. Foi uma batalha intensa entre esta cena e o icônico momento de enforcamento da babá, mas resolvemos ir com a cena do corte de cabelo, recriada quase que de modo idêntico no remake de 2006. No vídeo acima, o momento pode ser conferido aos 4min08s.

Ainda não plenamente convencido da identidade sobrenatural de seu filho Damien, o protagonista de A Profecia só tem um modo de confirmar oficialmente a paternidade real do garoto, e é procurar pela marca de 666 em seu couro cabeludo. Nesta cena em que Robert Thorn (Gregory Peck) vai lentamente cortando o cabelo do seu filho, o suspense só aumenta, embalado pela trilha sonora - vencedora do Oscar - de Jerry Goldsmith. Para completar uma cena de terror certeira, o momento de tensão termina com um ótimo jumpscare.

Alien - O Oitavo Passageiro (1979)
Dir.: Ridley Scott
Disponível para streaming no Telecine, e para compra/aluguel digital no Google Play, Apple TV e Microsoft Store

O suspense em Alien caminha a passos curtos. O terror sci-fi de Ridley Scott não tem pressa alguma em horrorizar seu público, o que cria uma tensão quase sufocante por toda a primeira parte do filme, com a tripulação da Nostromo sendo desviada para uma estranha missão paralela. Mas eventualmente a desgraça chega, e com estilo. 

Após ser infectado por um criatura desconhecida, Kane (John Hurt) parece se recuperar depois de dias em repouso. Os tripulantes da Nostromo, depois de muito estresse e discussões acaloradas, enfim se reúnem durante o jantar, alegres de finalmente estarem indo para casa.A celebração é interrompida quando Kane começa a convulsionar em dor e agonia. Então, seu tórax é rasgado por uma criatura alienígena. O desespero dos colegas é tomado pelo choque de, assim como o espectador, ver nascer um dos monstros mais marcantes do cinema.

A cena fala por si só, mas também tem uma deliciosa história de bastidores. Scott estava fascinado pela ideia de capturar as reações genuínas de terror de seu elenco. Portanto, preparou John Hurt para a cena muito antes de qualquer um chegar ao set. O roteiro que o restante dos atores ensaiou apenas descrevia o momento como “A coisa emerge”, segundo Sigourney Weaver, a Ellen Ripley [via Independent]. O elenco até suspeitava de algo, mas não da forma que foi conduzido, com todos chegando ao set para encontrar a produção com capas de chuva, e Hurt deitado na mesa. A surpresa do bebê Xenomorph saindo de dentro do colega, e o banho de sangue falso (e cortes de carne de boi) que levaram foram o suficiente para que Veronica Cartwright, a Joan Lambert, desmaiasse na hora. Não há atuação que supere medo autêntico.

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