O que foi a Assembleia Nacional Constituinte

Para compreender o que foi a Assembleia Nacional Francesa, que começou em 1789 e foi dissolvida em 1791, é necessário recobrar um pouco dos acontecimentos que levaram a França à revolução.

Com a crise econômica e política que se instalou na França durante o reinado de Luís XVI, a alta burguesia e os demais membros do chamado “Terceiro Estado” passaram a exercer uma grande pressão contra a administração do monarca absolutista. Essa pressão tinha por objetivo a obtenção de legitimidade política para os burgueses e o consequente fim dos privilégios que detinham o Primeiro e Segundo Estados, isto é, a nobreza e o clero, respectivamente.

O ponto alto dessa crise foi deflagrado pela convocação dos Estados Gerais, em maio de 1789, pelo rei para votar medidas que atendessem os anseios de todos. A votação era por feita por um representante de cada Estado, sendo assim, o Terceiro Estado sempre perderia de 2 votos contra 1. Os representantes do Terceiro Estado rebelaram-se contra tal medida e passaram a tomar as ruas da capital francesa, Paris. Em 14 de julho do mesmo ano, houve a tomada da Bastilha, uma fortaleza onde ficavam presos políticos do regime absolutista.

Em meio à insurgência da população, os líderes burgueses declararam-se em Assembleia Nacional Constituinte, isto é, reuniram-se para redefinir radicalmente as bases políticas da França, elaborando uma nova Constituição. A Assembleia Constituinte teve como principal alvo aquilo que solidificava o regime absolutista: a submissão dos súditos à figura do rei. No sistema absolutista, o rei é a fonte dos poderes, pois é do rei que vem o ordenamento jurídico e o poder de decisão soberano.

A Assembleia Constituinte tratou de explicitar que a fonte do ordenamento jurídico da França seria o povo, a própria população. Sendo assim, a Constituição a ser elaborada seria uma Constituição cidadã – modelo esse que seria adotado pelas nações que se formaram no século XIX. Uma das principais medidas da Assembleia foi tomada na noite do dia 04 de agosto de 1789: os deputados votaram pela abolição dos direitos feudais que ainda vigoravam na França.

Outra medida de suma importância foi a publicação da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. Essa declaração resolvia pontos como o dos direitos imprescindíveis, que seriam: a liberdade, a propriedade, a segurança e resistência à opressão. Também assegurava ao povo a fonte da soberania, a liberdade religiosa, a livre manifestação de opinião, taxação de impostos equitativa, entre muitas outras questões decisivas, que influenciaram o direito moderno, tanto civil quanto penal, bem como as constituições das democracias contemporâneas.


Por Me. Cláudio Fernandes

A mobilização de toda França em torno das mudanças, com a convocação dos Estados-gerais, abriu portas para o início das reformas políticas. A resistência monárquica acabou radicalizando esse processo com a queda da Bastilha e as diversas revoltas que se espalharam pelo território francês. O amplo apoio popular deu condições para que uma nova constituição fosse redigida por uma Assembleia Nacional.

A Assembleia Nacional, estabelecida entre 1789 e 1792, aboliu o voto por estamento e deu condições para que novas práticas fossem fixadas ao contexto político francês. Contando com a intensa participação da burguesia e dos camponeses, a Revolução ganhava força nas ruas, campos e instituições francesas. As leis que garantiam os privilégios nobiliárquicos foram abolidas, trazendo maior igualdade de direitos entre os franceses.

Em 26 de agosto de 1789, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão deu fim a qualquer dispositivo legal que diferenciava juridicamente as classes sociais francesas. Inspirada na Declaração de Independência dos Estados Unidos, o documento francês primava pela defesa da igualdade e da fraternidade. Apesar disso, a declaração ainda assegurava o direito de propriedade que preservou as posses da nobreza provincial.

Resistente às transformações, o rei Luís XVI negou-se a aprovar os termos da Declaração. Tal recusa provocou uma temerosa reação dos populares que tomaram o Palácio de Versalhes, forçando o rei a se mudar para o Palácio das Tulherias. No ano de 1790 o clero teve sua situação alterada com a Constituição Civil do Clero. Através deste documento, os clérigos transformaram-se em funcionários públicos subordinados ao Estado. Além disso, as terras clericais foram confiscadas e serviram de lastro para a criação de uma nova moeda, as assignats.

Mapa Mental - Revolução Francesa

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Em 1791, uma nova constituição começou a vigorar na França. De acordo com seus termos, o governo passaria a ser comandado por uma monarquia constitucional. O poder passou a ser exercido pelos três poderes: legislativo, executivo e judiciário. Apesar de limitar os poderes reais e abolir os privilégios, o novo governo foi dominado por um processo de aburguesamento das instituições, garantido por meio do voto censtário. A antiga união de interesses do Terceiro Estado agora não seria mais a mesma.

Os integrantes da assembleia antes mobilizados em torno do Terceiro Estado, agora se dividiam em dois novos grupos. Os jacobinos eram integrados por setores da pequena e média burguesia. Politicamente tinham uma posição mais radical que os girondinos, compostos por integrantes da alta burguesia que comandaram as reformas da nova monarquia constitucional.

Nas ruas os sans-cullotes promoviam a agitação dos centros urbanos e defendiam a adoção de medidas de caráter puramente popular. Desprovidos de um projeto político mais amplo mobilizavam-se em torno de reivindicações imediatistas como o tabelamento do preço dos alimentos. Tornando-se com grande poder de mobilização política, os sans-cullotes receberam o apoio político dos jacobinos.

O fim da antiga configuração sócio-política da França colocou a nobreza e a monarquia em situação desfavorável. Muitos senhores de terras abandonaram o país temendo a radicalização da revolução. As demais monarquias européias, temendo a expansão do ideal revolucionário, já ensaiavam uma contra-revolução. Objetivando buscar apoio de outras monarquias nacionais, o rei Luís XVI tentou fugir do país, sendo descoberto na cidade de Vernnes.

Esperando a invasão de outras nações européias, os revolucionários formaram um grande exército popular. Ao mesmo tempo, o insucesso da política econômica do novo governo potencializava as alas mais radicais. A invasão dos impérios austríacos e prussianos, em 1792, motivou a convocação do povo às armas. Liderados por Danton, Robespierre e Marat, o exército popular ordenou a execução de membros da nobreza.

Na Batalha de Valmy, de 20 de setembro de 1792, os exércitos contra-revolucionários foram vencidos pelo povo francês. Um inflamado sentimento nacionalista tomou conta dos participantes da revolução. Tomando as instituições de assalto, um novo governo tomou conta do país. A república foi instituída com a criação da chamada Convenção Nacional. Os jacobinos ganharam grande apoio político e o rei Luís XVI, considerado traidor, foi condenado à morte.

Por Rainer Sousa
Graduado em História

*Mapa Mental por Daniel Neves
Graduado em História

O que foi a Assembleia Nacional Constituinte

A Constituição Federal, também chamada Carta Magna, é o instrumento legal máximo de um país, estabelecendo os limites materiais e formais a todas as suas leis. O Brasil, por exemplo, já teve oito Constituições em vigor, incluindo a atual.

Uma Constituição pode ser originada e outorgada de forma autoritária, como ocorreu com a primeira Constituição Brasileira, em 1824, ou pode derivar da vontade popular, por meio de representantes eleitos para uma Assembleia Nacional Constituinte, como é o caso de nossa Constituição atual.

Desde que obedecidos alguns limites, a Constituição pode ser modificada dentro da ordem em vigor, mas você sabe como se dá o surgimento de uma Constituição inteiramente nova? Neste texto, trataremos da Assembleia Constituinte, responsável pela elaboração de uma nova Constituição.

Como surge a vontade por uma Constituição?

A noção de Poder Constituinte, concretizado na Assembleia Constituinte, está intimamente vinculada à idéia de contrato social, veiculada pelo filósofo Hobbes, que problematizava o regime absolutista defensor de um rei com poderes quase ilimitados, emanados de Deus.

Especialmente a partir do final do século XVIII, com os marcos representados pela Independência das 13 Colônias Britânicas e da Revolução Francesa, passou-se crescentemente a reivindicar a imposição de limites à vontade real, garantindo os interesses do povo e dando vazão à lógica de uma Monarquia Constitucional, regime em que o rei aceitava a limitação de seus poderes, geralmente por meio de uma constituição escrita. Desde então, numerosas foram as Assembleias constituídas ao redor do mundo, reivindicando um poder que emanaria do povo.

Entenda: quais as diferenças entre Monarquia e República?

O que significa Assembleia Constituinte?

Norberto Bobbio, em seu dicionário de política, define a Assembleia Constituinte como:

“um órgão colegial, representativo, extraordinário e temporário, que é investido da função de elaborar a Constituição do Estado, de pôr – em outros termos – as regras fundamentais ordenamento jurídico estatais.”

Tomando por base a definição feita por Bobbio, é possível perceber algumas características básicas à Assembleia Constituinte:

A Assembleia Constituinte é o órgão responsável pela elaboração da Constituição de um país, dando início a um novo ordenamento jurídico. Sendo extraordinária, uma Assembleia dessa natureza só existirá uma única vez durante o período de existência de um Estado, pois sua constituição dará início a um novo período democrático. O órgão é, portanto, também temporário, uma vez que, concluídas as suas funções, deixará de existir. Sendo um órgão colegial e representativo, a Assembleia é composta por diversos indivíduos, escolhidos para representarem o povo de seu Estado.

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Quando é convocada uma Assembleia Constituinte?

A necessidade de convocação de uma Assembleia Constituinte é percebida quando a Constituição em vigor (ou sua ausência) não representa a realidade vivida por um país e não tem sua legitimidade validada pela vontade popular. Segundo Pedro Lenza:

“A partir da quebra do processo constitucional, vale dizer, diante da não correspondência entre o texto posto e a realidade social, poderá surgir espaço para o denominado ‘momento constituinte’ democrático e, assim, diante da manifestação do poder constituinte originário, a elaboração de novo documento que encontre legitimidade social.”

Esse Poder Constituinte Originário é representado pela Assembleia Constituinte e, ao elaborar uma nova Carta Magna, rompe completamente com a ordem jurídica precedente, dando início a um novo Estado. Vale ressaltar que, conquanto a Assembleia Constituinte seja um órgão temporário, o Poder Constituinte Originário é permanente, já que sobreviverá à Constituição, passando a perpassar toda a ordem jurídica, como forma e expressão da liberdade humana.

De fato, podemos perceber claramente que todas as constituições brasileiras surgiram em momentos de ruptura da ordem vigente, como, por exemplo: em sua independência; quando da Proclamação da República; no início do Estado novo; e após o golpe militar de 1964.

E qual a sua importância?

Entender no que consiste a Assembleia Constituinte é fundamental para qualquer cidadão, uma vez que é o povo o titular do poder desse órgão, sendo o responsável por determinar quando é necessária sua instituição. Mesmo em períodos ditatoriais, sua titularidade não deixa de existir, como afirma Alexandrino:

“… o titular do poder constituinte é o povo (e não mais a nação), pois só este tem legitimidade para determinar quando e como deve ser elaborada uma nova Constituição, ou modificada a já existente. A soberania popular, que é, na essência, o poder constituinte do povo, é a fonte única de que procedem todos os poderes públicos do estado. Mesmo nos regimes ditatoriais é o povo o único e legítimo titular do poder constituinte (o que se dá, nesse caso […] é a usurpação desse poder).”

As limitações

Há intensas discussões doutrinárias acerca das limitações do Poder Constituinte Originário, especialmente entre as correntes chamadas Positivistas e Jusnaturalistas.

De fato, ao dar início a uma nova ordem jurídica, a Assembleia Constituinte não está ligada a normas jurídicas anteriores, podendo, inclusive, romper com as mesmas. A reforçar essa tese, estaria o fato de que dois dos princípios que regem a Ordem Jurídica Internacional são o da Soberania Estatal e o da Não Intervenção em Assuntos Internos de Outros Países. Dessa forma, não existe uma instituição acima da vontade estatal, capaz de criar normas que devem ser obedecidas por todos os países.

Por sua vez, autores Jusnaturalistas defendem que isso não conferiria à Assembleia Constituinte um poder arbitrário e absoluto, que poderia ignorar quaisquer preceitos de justiça. O Direito Internacional, atualmente, reconhece a existência de normas que, por sua própria natureza, estariam acima da vontade estatal e deveriam ser sempre respeitadas.

Essas normas, chamadas normas de Jus Cogens, ainda que pouco numerosas, já foram afirmadas pela Corte Internacional de Justiça e dizem respeito principalmente a temas de Direitos Humanos, proibindo práticas como o Genocídio, o Tráfico de Pessoas e a Pirataria. Nesse sentido, nem mesmo o Poder Constituinte Originário, personificado em uma Assembleia Nacional Constituinte eleita democraticamente, poderia recepcionar em uma nova Constituição mecanismos que violassem esses preceitos básicos.

Conseguiu entender o poder de uma Assembleia Constituinte? Deixe suas dúvidas e sugestões nos comentários! 

O que foi a Assembleia Nacional Constituinte

REFERÊNCIAS

Marcelo Alexandrino; Vicente Paulo: Direito Constitucional Descomplicado

Norberto Bobbio: Dicionário de Política

BRASIL. Constituição (1988): Constituição da República Federativa do Brasil

Dalmo de Abreu Dallari: Elementos de Teoria Geral do Estado

Pedro Lenza: Direito Constitucional Esquematizado