O por que da consciência negra

O dia 20 de novembro é celebrado como o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra no Brasil. A data surgiu como forma de luta contra o racismo e a desigualdade social histórica que a população preta enfrenta desde a escravidão, além de conscientizar e promover políticas de integração para essa população. 

A escolha do dia 20 de novembro não é à toa. A data é uma referência à morte de Zumbi dos Palmares, que foi morto em 20 de novembro de 1695. Zumbi foi o maior líder do Quilombo dos Palmares, o maior quilombo da história do Brasil. O líder é tido como um dos símbolos de resistência e luta contra a escravidão no país. 

Mas, o que é ter consciência negra? 

Falar de consciência negra é refletir sobre os espaços de exclusão da população preta na sociedade. Foram 300 anos de escravidão, uma marca que deixa efeitos que não se apagam em pouco tempo.   

No vídeo abaixo, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), pesquisadores da instituição abordam de forma didática questões como o racismo, justiça racial, cultura afro-brasileira e os principais aspectos ligados à consciência negra. Confira:

Negros no mercado de trabalho 

Um estudo divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2020, apontou que a taxa de desocupação, isto é, de desemprego em 2019, foi de 9,3% para brancos e 13,6% para pretos ou pardos.  

Já entre as pessoas ocupadas em trabalhos informais, pretos ou pardos são 47,4%, enquanto trabalhadores brancos o percentual é de 34,5%. Além disso, pretos e pardos estão mais presentes em atividades agropecuárias (62,7%), construção (65,2%) e serviços domésticos (66,6%). 

De acordo com os dados da pesquisa, a população branca ganhava em média 73,4% mais do que a preta ou parda em 2019. Isso significa dizer que enquanto a renda mensal de trabalho de uma pessoa branca era de R$ 2.884, a de uma pessoa negra era de R$ 1.663.  

Dados mais recentes, coletados por uma pesquisa encomendada pelo Grupo Carrefour ao Instituto Locomotiva, mostrou que se os profissionais pardos e pretos ganhassem o mesmo salário que os brancos no país, seria adicionado quase R$ 1 trilhão de renda ao mercado de trabalho nacional (saiba mais).   

Problema estrutural 

Existem ainda outras questões estruturais que impactam diretamente na vida do negro e mostram a desigualdade e o preconceito que ainda existe, como o acesso à educação, moradia, extrema pobreza e violência. 

No estudo do IBGE, a extrema pobreza no país passou de 5,8%, em 2012, para 6,5%, em 2019, segundo a linha internacional fixada pelo Banco Mundial. O estudo ainda mostrou que, dos 13,689 milhões na linha da extrema pobreza, 76,7% são pretos ou pardos. 

A pesquisa do Instituto Locomotiva levantou que apenas 11% da população negra concluiu o ensino superior, enquanto 8% não frequentou a escola. Já dos que foram à escola, 91% estudaram em colégio público, 89% nunca fizeram cursos de idiomas e 74% nunca receberam nenhuma certificação profissional.  

Segundo o Atlas da Violência 2021, a chance de uma pessoa negra ser assassinada no Brasil é 2,6 vezes superior à de uma pessoa não negra. De acordo com os dados, a taxa de homicídios por 100 mil habitantes negros no Brasil em 2019 foi de 29,2 contra 11,2 da soma de amarelos, brancos e indígenas.  

Ter consciência e respeito no dia a dia 

Compreender e, principalmente, refletir todas essas questões históricas de desigualdade que perduram até os dias de hoje é fundamental para se entender toda a luta e reinvindicações do povo negro.  

É preciso ter “consciência negra” o ano inteiro e não somente no dia 20 ou durante o mês de novembro. É preciso reconhecer lugares de privilégios dentro da estrutura social. E como diz a filósofa estadunidense Angela Davis: “Numa sociedade racista não basta não ser racista, é preciso ser antirracista”. 

Tudo isso precisa ser refletido em nossas ações e falas no dia a dia. Alguns livros podem ajudar a entender melhor questões raciais, como: 

A Fundação Tide Setubal e o Itaú Cultural lançaram uma plataforma que traz informações embasadas sobre as heranças culturais do Brasil, começando pela temática afro-brasileira. Acesse www.ancestralidades.org.br para saber mais.

O Dia da Consciência Negra é uma data celebrada no Brasil no dia 20 de novembro. Este dia está incluído na semana da Consciência Negra e tem como objetivo uma reflexão sobre a introdução dos negros na sociedade brasileira.

O dia 20 de novembro foi escolhido como uma homenagem a Zumbi dos Palmares, data na qual morreu, lutando pela liberdade do seu povo no Brasil, em 1695. Zumbi, líder do Quilombo dos Palmares, foi um personagem que dedicou a sua vida lutando contra a escravatura no período do Brasil Colonial, onde os escravos começaram a ser introduzidos por volta de 1594. Um quilombo é uma região que tinha como função lutar contra as doutrinas escravistas e também de conservar elementos da cultura africana no Brasil.

Em 2003, no dia 9 de janeiro, a lei 10.639 incluiu o Dia Nacional da Consciência Negra no calendário escolar. A mesma lei torna obrigatória o ensino sobre diversas áreas da História e cultura Afro-Brasileira. São abordados temas como a luta dos negros no Brasil, cultura negra brasileira, o negro na sociedade nacional, inserção do negro no mercado de trabalho, discriminação, identificação de etnias, etc.

Nos Estados Unidos e Canadá existe o "Black History Month" (Mês da História Negra), celebrado todos os anos em fevereiro.

Aprenda mais sobre o que é discriminação, racismo, xenofobia e etnia.

A consciência negra refere-se ao processo de tomada de consciência de um afrodescendente acerca de suas raízes e tradições históricas, bem como de toda a violência causada pelo racismo. O termo também está muito associado com a data comemorativa do Dia da Consciência Negra, celebrado em 20 de novembro.

Acesse também: Racismo no Brasil: como esse grave problema manifesta-se na sociedade brasileira?

O que é a consciência negra?

Podemos dizer que a expressão “consciência negra” faz menção à tomada de consciência histórica e cultural da pessoa enquanto afrodescendente. Essa tomada de consciência está relacionada com o processo em que a pessoa se percebe negra e se identifica com as suas raízes históricas e culturais, situações relacionadas com a formação da identidade de um indivíduo.

O por que da consciência negra
A consciência negra nos permite resgatar e valorizar a cultura afrodescendente, bem como tomar consciência dos problemas causados pelo racismo.

Nesse processo o indivíduo se identifica com as tradições e valores culturais que remetem às suas raízes afrodescendentes, além de tomar consciência da violência que os negros sofrem e sofreram historicamente tanto no Brasil como em outras partes do mundo. Além disso, também percebe o racismo como um problema estrutural da sociedade contemporânea.

A partir do autorreconhecimento do indivíduo como negro, do resgate das suas raízes culturais e da tomada de consciência histórica de como o racismo permeia a formação da sociedade brasileira, esse indivíduo consegue perceber a importância de engajar-se na luta pela equidade racial, o que inclui questões como direitos iguais no acesso à cultura e educação, oportunidades iguais no mercado de trabalho, o fim da violência cotidiana contra as populações negras, etc.

Por outro lado, essa tomada de consciência não se faz apenas entre as pessoas negras, mas  também entre as pessoas brancas. Assim, pessoas brancas passam a enxergar todos os pequenos privilégios que elas possuem enquanto brancos, o que pode permitir que elas mudem sua forma de agir perante situações de injustiça e, claro, transformar suas ações para que atitudes racistas não sejam reproduzidas.

Acesse também: Limitações da Lei Áurea — lei que aboliu a escravidão no Brasil

O racismo é um grande problema da nossa sociedade e cada vez mais ações para combatê-lo se fazem necessárias. Ações afirmativas, educação e até mesmo meios legais são formas de lutar contra práticas racistas. Uma das ações afirmativas que surgiram por meio da luta dos movimentos negros no Brasil foi o Dia da Consciência Negra.

O por que da consciência negra
A consciência negra discute como o racismo afeta a nossa sociedade. A violência policial, por exemplo, é um reflexo dessa realidade. [1]

Esse dia é celebrado em nosso país anualmente em 20 de novembro, e a escolha dessa data não foi aleatória, mas proposital. O dia 20 de novembro é marcado na história brasileira como o dia do assassinato de Zumbi dos Palmares, liderança quilombola que foi perseguida pelas autoridades portuguesas no final do século XVII.

A data da morte de Zumbi foi descoberta na década de 1970, e o movimento negro transformou-a em um símbolo da luta dos negros no Brasil. A escolha dessa data como símbolo de luta se deu em 1978, quando o Movimento Negro Unificado contra a Discriminação Racial se reuniu em um congresso na cidade de São Paulo.

O Vinte de Novembro se estabeleceu como uma alternativa ao Treze de Maio, que faz referência à abolição do trabalho escravo em 1888. Isso porque o Treze de Maio era intensamente questionado por ter sido um processo que se fez sem que nenhum tipo de assistência fosse criado em benefício da população negra.

No contexto de fortalecimento dos movimentos sociais nos anos finais da Ditadura Militar, a comemoração em torno do Vinte de Novembro ganhou força e, na década de 1990, começou a se transformar em feriado em algumas partes do Brasil. Isso se deu porque a sociedade brasileira se tornou mais democrática ao final da ditadura, e os processos de decisões políticas se tornaram mais abertos aos movimentos sociais.

Com isso, uma série de conquistas foi possível, como o surgimento destas leis:

  • Lei n.º 7.716, de 5 de janeiro de 1989, que define o preconceito racial e de cor como crime;
  • Lei n.º 12.711, de 29 de agosto de 2012, que determina cotas raciais para o ingresso de estudantes negros nas universidades e instituições federais;
  • Lei n.º 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que tornou obrigatório o ensino de História e Cultura Afro-Brasileira nas escolas de nosso país.

O Dia da Consciência Negra se estabeleceu como uma “data comemorativa” no calendário nacional também por meio de uma lei. Essa foi a Lei n.º 12.519, de 10 de novembro de 2011, e, assim, o dia 20 de novembro foi oficialmente incluído como uma data em referência à consciência negra. A lei não determinou a data como feriado obrigatório e, segundo levantamento feito por Laurentino Gomes, até 2018, apenas 1047 municípios de um total de 5561 tinham transformado a data em feriado|1|.

Acesse também: Três grandes abolicionistas negros do Brasil

Importância do Dia da Consciência Negra

O Dia da Consciência Negra é uma data extremamente importante, pois nos permite resgatar e valorizar a história do povo negro e sua luta pela liberdade no Brasil. Além disso, a data serve como um holofote que coloca em evidências problemas estruturais de nossa sociedade, muitos deles interligados com o racismo.

O advogado e filósofo Silvio Almeida definiu o racismo como uma estrutura que permeia todas as instâncias da sociedade contemporânea, por isso ele coloca que o racismo sempre é estrutural e “integra a organização econômica e política da sociedade”. Assim, Silvio Almeida define que  racismo é manifestação normal de uma sociedade contemporânea|2|.

Sílvio Almeida ainda estende dizendo que o racismo fornece sentido, lógica e tecnologia para perpetuar a violência e a desigualdade social tão presentes na nossa sociedade|3|. Por meio dessas considerações, podemos visualizar o quão arraigado é o racismo em nossa sociedade e como as injustiças são reproduzidas de maneira automática pelas pessoas.

A importância do Dia da Consciência Negra é exatamente esta: é uma data que abre espaço para que esse problema seja verbalizado. A reflexão proporcionada por essa data permite que muitas pessoas possam enxergar o problema do racismo na sociedade. Claro que esse é apenas um ponto de partida: uma atuação antirracista não deve estar restrita ao dia 20 de novembro, mas sim a todos os dias do ano.

Notas

|1| GOMES, Laurentino. Escravidão: do primeiro leilão de cativos em Portugal até a morte de Zumbi dos Palmares – Volume 1. Rio de Janeiro: Globo Livros, 2019, p. 422.

|2| ALMEIDA, Silvio Luiz de. Racismo Estrutural. São Paulo: Sueli Carneiro; Editora Jandaíra, 2020, p. 20-21.

|3| Idem, p. 21.

Créditos da imagem

|1| a katz e Shutterstock