O que deve conter numa analise comparativa

É comum sempre fazermos uma análise comparativa durante um processo de escolha. Essa é uma forma simples e útil que todos podemos usar para escolher, por exemplo, um item de consumo. Mas a análise por comparação tem outras finalidades e pode ser feita utilizando métodos elaborados em situações que demandam o parecer e decisão de várias pessoas.

 O consumidor, de uma forma geral, compara produtos ponderando as características que são importante para ele. Pode ser preço, qualidade, durabilidade, facilidade de uso, garantia, assistência técnica e outros. Essas características podem ter relevância diferente conforme o critério de valores e a importância atribuída pelo decisor. Por exemplo, para comprar pneus, muitos consumidores consideram a durabilidade como sendo o item mais importante, inclusive, mais importante que o preço; em contrapartida, para outros consumidores, a reputação da marca do fabricante pode ser mais importante que a durabilidade porque eles valorizam a confiabilidade da marca.

 Para elaborar uma análise comparativa é preciso analisar a estrutura dos atributos considerados importantes pelos consumidores e a estrutura subjacente à avaliação destes atributos. O consumidor compara e decide sobre dois ou mais produtos usando a combinação da informação específica que obtém para a decisão e o conhecimento que já tem em mente.

 As análises comparativas se estendem também aos setores de negócios onde os avaliadores utilizam metodologia específica e conduzem análises complexas, dependendo dos elementos a serem comparados. Ao comparar dois ou mais elementos há, necessariamente, um escopo para descobrir algo desconhecido sobre qualquer um dos elementos comparados.

 A crescente necessidade de boas análises comparativas de negócios tem sido uma oportunidade para os analistas profissionais, por exemplo, analista de investimentos, analista de mercado, analista de planejamento financeiro e tributário etc. Imagine que você precisa decidir sobre a compra e contratação de um software de automação de marketing para sua empresa. A automação de marketing é algo bem comum em marketing digital. Os softwares de automação de marketing trabalham uma série de rotinas e permitem que o marketing adquira mais eficiência, por exemplo, ao criar call to action (os gatilhos), ou fazer o primeiro contato com o cliente, ou reduzir o custo de aquisição de clientes e identificar oportunidades, qualificar leads, fazer testes A/B e gerar os relatórios de resultados. Há disponível no mercado um grande número de ferramentas de automação de marketing. Conhecer todas é, praticamente, impossível e analisar muitas não é produtivo porque há diferenças de escopo entre elas, o que torna a análise comparativa mais complexa. Há mais de 20 rotinas de marketing que podem ser automatizadas, por exemplo, teste A/B, SMS marketing, mídias sociais, localização de conteúdo, SEO, palavra-chave e outras. Essa análise comparativa é complexa, e por isso, é preciso elaborar um projeto que defina: 

  • as atividades que devem ser automatizadas;
  • os softwares de automação de marketing  disponíveis no mercado (essa fase pode incluir benchmark e outras pesquisas) e quais estão inclusos na analise comparativa;
  • as características e atributos relevantes para a análise. 

Em projetos como este, as empresas buscam ajuda e terceirizam o trabalho para um especialista, que então faz a análise comparativa. 

As análises comparativas em negócios têm ampla aplicação. Muitas são feitas exclusivamente com a finalidade de avaliar conjuntos completos de dados. As análises comparativas de dados são geralmente para fornecer melhorias em processos existentes. Á primeira vista, elas podem parece uma pesquisa simples, entretanto, como é da natureza dos estudos comparativos, elas podem levantar questões que o escopo do estudo não responde e, com isso, gerar entraves. 

Quando se trata de conduzir análise comparativa de dados, as empresas distinguem entre comparar dados quantitativos e dados qualitativos. A realização de pesquisas secundárias usando dados quantitativos para comparação é bastante comum entre as empresas, pois a obtenção das informações necessárias é, em geral, de baixo custo.  

Ao comparar dados qualitativos, os analistas tendem a usar conjuntos de dados relativamente pequenos e simples. Embora não seja necessário ter um número específico de casos para obter significado estatístico, o ideal é ter casos suficientes para exibir potencialmente todas as configurações possíveis. 

Como podemos perceber, as análises comparativas não são utilizadas apenas em marketing ou negócios,  mas são significativamente úteis para a tomada de decisão em negócios. Os exemplos que dei acima são simples, porque, de fato, quaisquer duas ou mais coisas que tenham algumas características comuns subjacentes podem ser comparadas e analisadas. A escolha por utilizar uma metodologia para fazer a comparação depende do que está em jogo.

O objetivo deste texto é explorar e discutir as características, aplicabilidade e limitação de dois métodos de pesquisa; a saber Análise de Conteúdo e Análise de Discurso, em um âmbito comparado e voltado para a produção de textos científicos na área de Relações Internacionais. Para este fim, o presente trabalho se ocupa, em primeiro lugar, em definir o método de pesquisa, para a seguir abordar os dois aqui estudados de forma comparativa e, por último, afirmar como podem ser utilizados em conjunto durante uma pesquisa. A escolha dos dois métodos se justifica através da intenção de entender os fenômenos sociais para interpretar o objeto de pesquisa.

O método de pesquisa é aquele que difere Ciência (episteme) de opinião (doxa), através da elaboração de um relato (logos) que passa a contrastar o mítico (mythos). Desta forma, é um elemento essencial para a própria existência da área científica, junto com objeto e um corpo de conhecimentos científicos próprios. A utilização do método científico permite uma maior objetividade e distância que permite observação, experimentação, e sistematização de uma temática. No entanto, nas ciências sociais, o observador não pode alhear-se ele próprio de uma concepção de mundo que condiciona sua relação com os fatos que observa (MALTEZ, 2007).

Cabe afirmar, ainda assim, que os métodos de pesquisa aqui apresentados não estão isentos de uma maior subjetividade por parte do analista, visto que a separação entre pesquisador e objeto não pode ser total em uma ciência social. Ambas as técnicas aqui apresentadas são voltadas para a compreensão de mensagens e processos de comunicação, ainda que tenham diferenças em como abordar seu objeto. Como se verá, o primeiro, por sua sistematização, é  por vezes considerado quantitativo enquanto o segundo é plenamente qualitativo. Este texto procura equilibrar ambos os aspectos com fins de encontrar um balanço ideal a ser utilizado no projeto de pesquisa.

Como modalidade científica, a Análise de Conteúdo é amplamente estudada nas mas diversas áreas das Ciências Sociais, devido à sua característica qualitativa que se define pela ““abordagem metodológica crítica e epistemologicamente apoiada numa concepção de ciência que reconhece o papel ativo do sujeito na produção do conhecimento” (FRANCO, 2008, apud. CARDOSO, OLIVEIRA, GHELLI, 2021, p. 101). 

A Análise de Conteúdo tem como ponto de partida, portanto, a mensagem e seu significado expresso e é considerada como uma técnica de tratamento de dados que procura identificar que mensagens estão sendo produzidas a respeito de determinado tema (BASTOS e OLIVEIRA, 2015). Desta forma, inclui materiais escritos, dentre os quais jornais, livros, questionários, tratados e artigos; orais, como entrevistas e discursos; iconográficos, como imagens e filmes; e códigos semióticos que variam entre música, dança, gestos e comportamentos (CARDOSO, OLIVEIRA, GHELLI, 2021). 

Tendo em conta que o conteúdo existe dentro de um contexto, é dever do analista levá-lo em conta, de forma sistemática e objetiva, a fim de extrair também o subtexto. Visto que os documentos analisados oferecem diferentes leituras, sua aplicação é vasta. Metodologicamente, no entanto, suas características são claras e constituem-se de uma pré-análise (recolha de documentos, formulação de hipótese e de objetivos), uma análise ou codificação do material (escolha de unidades de registro e contexto, definição de regras de enumeração e categorização do material estudado) e, por fim, o tratamento dos resultados e interpretação (estabelecimento de quadros resultantes e relevo de informações retiradas (CAMPOS, 2004; CARDOSO, OLIVEIRA, GHELLI, 2021).

Relativo à procedimentalização, as dimensões principais são sintática e semântica, que se focam, respectivamente, nos transmissores de sinais e suas relações, e nos sentidos dos sinais (BASTOS E OLIVEIRA, 2015). Em termos de aplicabilidade, também é importante levar em conta um conjunto de regras para a escolha do corpo textual: Cardoso, Oliveira e Ghelli (2021) citam tais como a regra da objetividade, na qual uma vez definido o campo é preciso levar em conta todos os elementos; a regra da representatividade, para medir o nível de rigor e universalidade da pesquisa; a regra da pertinência, na qual os documentos devem, necessariamente, corresponder ao objeto de pesquisa; e a regra da homogeneidade, na qual eles devem obedecer à claros critérios de escolha. Em suma, este método é utilizado para descrever e interpretar o conteúdo de todo tipo de comunicações, cujo sentido não é único e pode ter natureza psicológica, sociológica, política ou histórica (CARDOSO, OLIVEIRA, GHELLI, 2021)

Uma grande questão em relação à objetividade/subjetividade do método de pesquisa em ciências sociais é visto neste método, visto que, por um lado, se deve partir dos conteúdos manifestos objetivamente e obter resultados que reflitam o objetivo da pesquisa e têm apoio bibliográfico manifesto, mas, por outro, não é possível desconsiderar fatores contextuais e subjetivos. A desconsideração de um em detrimento ao outro leva, em seus extremos, à negação da subjetividade humana ou imposição de valores não consistentes com o fato objetivo (CAMPOS, 2004): o extremo do conteúdo, portanto, leva à excessiva metodologização da pesquisa e perda do âmbito social do objeto. Além disto, uma grande limitação do método é não considerar as informações raras, ausentes ou subentendidas, mas ainda relevantes para a análise realizada (BASTOS E OLIVEIRA, 2015).

Este método, em suma, procura responder como um determinado discurso, que é o objeto de estudo, funciona. Isto quer dizer que se ocupa em estudar os sentidos produzidos, os sujeitos (interlocutores e audiência), a articulação do discurso, e modos de controle do poder-dizer (BENETTI, 2016). Ou seja: se ocupa não só em aprender como uma mensagem é transmitida, mas também em explorar seu sentido dentro de seu contexto (BASTOS E OLIVEIRA, 2015). Este método passa a ser amplamente utilizado em Ciências Sociais do contexto do rompimento do representacionalismo da linguagem, ou seja, a ideia de que esta é apenas um reflexo das condições materiais da realidade e não também uma moldadora destas (GOMES, 2011)

De maneira semelhante à Análise de Conteúdo, os objetos do método perpassam textos tradicionais, como ensaios e discursos; textos autônomos, como tatuagens e grafites; e textos que já seguem um método próprio, como entrevistas e questionários (BENETTI, 2016). A unidade de análise é, naturalmente, o texto, que pode ser composto por letras, cores, imagens ou sons, e ser verbal ou não verbal, preferentemente homogêneos (isto é, pertencem a um mesmo meio) e sincronizados (em um ciclo de tempo determinado). 

Há distintos tipos de abordagem no método, dentre os quais análise dos sentidos, dos sujeitos, do silenciamento, e da própria estruturação do discurso. Metodologicamente, possui quatro temas principais: preocupação com o discurso em si mesmo, o entendimento da linguagem como uma construção, ênfase no discurso como forma de ação, confiança na organização da retórica do discurso (BASTOS E OLIVEIRA, 2015).

Um dos conceitos fundamentais do método é o dialogismo, que, como explica Benetti (2016), se refere à relação entre sujeitos (intersubjetividade) e discursos (interdiscursividade). Na análise de discurso, o texto não é um objeto com o qual o sujeito se relaciona, mas uma potência discursiva que concretiza as relações entre sujeitos – o discurso, portanto, ocorre no espaço entre os interlocutores. De fato, sujeito e subjetividade são fundamentais neste método de pesquisa – o sujeito existe dentro de um contexto histórico e, assim, não tem completa liberdade, mas tampouco é completamente assujeitado e deixa de ser único. Neste mesmo sentido, o processo de formação discursiva existe dentro de uma perspectiva ou ideologia delimitada por outros discursos. 

Portanto, este método exige um posicionamento ativo na interpretação e a compreensão do seu próprio lugar como sujeito do discurso. No entanto, nisto também se insere a principal fraqueza do método, que é a falta de um sistema ou possibilidade de quantificar resultados de uma maneira exata (GONÇALVES, 2016) – há um risco, portanto, da falta de rigor científico na análise. Além disso, em seu ponto extremo a Análise de Discurso pode ficar presa ao textualismo – isto é, leitura cuidadosa dos documentos que fica presa a apenas isto (GOMES, 2011).

Ambos os métodos aqui estudados se ocupam da análise de mensagens, mesmo que apenas o primeiro cumpra o requisito de sistematização. Ainda assim, há uma série de diferenças fundamentais entre os dois: a Análise de Conteúdo adota o procedimento de codificar o material empírico para categorizar ou desenvolver uma teoria – busca reduzir o material empírico – enquanto a Análise de Discurso se foca na reconstrução da estrutura do texto – aumenta o material textual; e a primeira trabalha com conteúdo, enquanto a segunda, com o sentido (GONÇALVES, 2016). Uma mantém a neutralidade técnica e distanciamento entre pesquisador e objeto, enquanto a outra rejeita a mera consideração de que a linguagem pode ser neutra.

Em Relações Internacionais (RI), a discussão a respeito de objetividade e subjetividade na pesquisa deu origem a, pôr instância, o Terceiro Debate entre racionalistas e reflexivistas e, em linhas gerais, ainda ecoa entre neorrealistas e pós-positivistas da atualidade (GOMES, 2011). A Análise de Discurso, desde este período, passa a ser utilizada com certa frequência em âmbitos como terrorismo e elitismo, que tratam precisamente do uso de mensagens como ferramentas de segurança e poder. É inegável, afinal, a relação entre política e comunicação, principalmente através de tratados, discursos e conteúdos midiáticos. 

Ainda assim, devido à natureza interdisciplinar das RI, há áreas de análise que exigem por natureza uma leitura cuidadosa e sistemática dos dados disponíveis, dentre as quais se destaca a Economia. Além disto, a análise internacional – sobretudo em temas como estratégia – deve ser necessariamente objetiva e neutra para que cumpra a sua função.

No contexto do presente projeto de pesquisa, no entanto, é necessário reconhecer a não neutralidade entre pesquisador e objeto e o papel do discurso e das subjetividades no âmbito de estudo. A fundamentação teórica, afinal, é plenamente pós-positivista ao contar com a presença de pós-colonialismo, decolonialidade e teorias queer. Ainda assim, tendo em vista a presença de fatores econômicos e políticos quantificáveis fundamentais para a formulação do argumento, é preciso também estabelecer um maior rigor metodológico neste sentido. A complementaridade entre ambos os métodos aqui utilizados, portanto, se dá precisamente quando seu uso em conjunto equilibra a necessidade técnica de uma sistematização de pesquisa do conteúdo existente e a qualidade discursiva e contextualizada no espaço-tempo. 

Em Ciências Sociais, e sobretudo no presente caso, a análise científica não pode ser completamente objetiva e neutra e irá se inserir, necessariamente, dentro de um contexto sociolinguístico do qual não é possível escapar. Ao reconhecer isto, os métodos aqui estudados existem em um delicado balanço entre a objetividade da ciência e a subjetividade do objeto de pesquisa, que muitas vezes é o próprio interlocutor. Sua importância metodológica, mesmo assim, é encontrada nos mais variados âmbitos: objetos empíricos existem dentro do contexto da linguagem (BENETTI, 2016) e é, neste sentido, frequente o uso de modelos de interpretação qualitativa de textos em pesquisas quantitativas e mistas (GONÇALVES, 2016). 

De fato, a triangulação entre a pesquisa quantitativa e qualitativa fornece uma maior riqueza de dados para a discussão em questão. Enquanto este trabalho possui uma caracterização muito mais qualitativa, se reconhece o espírito desta afirmação e, visto que haverá uma abordagem relativa ao papel do discurso como ferramenta econômica que possui resultados quantificáveis, verifica-se necessário realizar uma pesquisa mais sistemática que a proporcionada pelo discurso. Busca-se, portanto, a construção de um método de pesquisa que some ambos os elementos necessários para sua completude. 

BASTOS, H. M; OLIVEIRA, U. Análise de discurso e Análise de Conteúdo: Um breve levantamento bibliométrico de suas aplicações nas ciências sociais aplicadas da
Administração. In: XII Simpósio de Excelência em Gestão e Tecnologia, Associação Educacional Dom Bosco, 2015.

BENETTI, M. Análise de Discurso como método de pesquisa em Comunicação. In:  MOURA, C.; LOPES, M. I. (org.) Pesquisa em Comunicação: Metodologias e Práticas Acadêmicas. Porto Alegre: ediPUCRS, 2016.

CAMPOS, C. J. Método de análise de conteúdo: ferramenta para a análise de dados qualitativos no campo da saúde. Revista Brasileira de Enfermagem, n. 57, v. 5, p. 611-614, 2004

CARDOSO, M. R. G.; OLIVEIRA, G. S.; GHELLI, K. G. M. Análise de Conteúdo: uma metodologia de pesquisa qualitativa. Cadernos da Fucamp, v.20, n.43, p.98-111/2021.

GOMES, A. T. Análise do Discuro e Relações Internacionais: duas abordagens. Revista Política Hoje, v. 20, n. 2, p. 642-676, 2011

GONÇALVES, A. T. P. Análise de conteúdo, análise do discurso e análise de conversação: estudo preliminar sobre diferenças conceituais e teórico-metodológicas. Administração: Ensino e Pesquisa, v. 17, n. 2, p. 275-300, 31 ago. 2016.

MALTEZ, J. A. Metodologias da ciência política: o Estado à procura do politico. Lisboa: ISCSP, 2007.