Por que empresas aereas quebram

Luciana Dyniewicz - O Estado de S.Paulo

04 de maio de 2019 | 18h37

Um leilão marcado para ocorrer na terça-feira, 7, em um edifício próximo à Avenida Paulista, em São Paulo, colocará fim a mais uma companhia aérea brasileira. A Avianca Brasil será a 11.ª empresa do setor a encerrar as operações desde 2001 no País, que tem taxa de mortalidade de uma empresa a cada dois anos. 

Desafio de companhias aéreas é equilibrar oferta e demanda

Os casos de falência ou de recuperação judicial na aviação não são exclusividade do Brasil. Neste ano, outras nove empresas aéreas endividadas deixaram de voar no mundo, desde pequenas, como a sul-coreana AirPhilip, até companhias mais relevantes, como a Jet Airways, que chegou a ser uma das maiores da Índia. Nos EUA, American Airlines, Delta e United já tiveram de recorrer ao Chapter 11, o equivalente à recuperação judicial brasileira, mas acabaram sobrevivendo. 

A operação internacional da Avianca queimou rapidamente o caixa da companhia, que já não tinha boa performance Foto: Carlos Garcia Rawlins/Reuters

Margens baixas, necessidade de injeções volumosas de capital, contratos de longo prazo com arrendadoras de aeronaves e vulnerabilidade ao preço do combustível – e ao dólar, no caso brasileiro – estão entre os fatores que explicam a elevada taxa de mortalidade.

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“É uma indústria muito difícil no mundo todo”, diz Jerome Cadier, presidente da Latam no Brasil. “Temos incerteza de curto prazo em relação à demanda e necessidade de tomar decisões de longo prazo, como o tamanho da frota. São decisões caras e difíceis de tomar.” 

Empresas aéreas brasileiras que quebraram ou entraram em recuperação judicial

Nota: *Saiu da recuperação em 2017

Fonte: Abear e André Castellini

Foram basicamente duas dessas decisões que tornaram a situação da Avianca insustentável nos últimos anos, segundo analistas. Uma delas foi a de não enxugar a frota em 2015 e 2016, período mais delicado da aviação brasileira desde os anos 2000. Foram nesses anos que a crise econômica derrubou a demanda por transporte aéreo e os custos foram pressionados pela alta do dólar e do petróleo.

Nessa época, muitos apostaram que a Gol seria a primeira a sucumbir – dado seu nível de endividamento –, mas uma renegociação com credores, aliada a um plano de devolução de aeronaves, garantiu a virada do jogo. Latam e Azul fizeram movimentos semelhantes em suas frotas e contaram ainda com novos recursos – a primeira vendeu uma participação para a Qatar e a segunda abriu capital. A Avianca, porém, não recuou no número de aeronaves, em uma tentativa de ganhar participação de mercado.

Outra decisão equivocada foi a entrada no mercado internacional, em 2017. Um voo para o exterior tem um custo médio dez vezes superior ao de um doméstico. Se o avião não sai lotado, portanto, o prejuízo é grande. A operação internacional da Avianca queimou rapidamente o caixa da companhia, que já não tinha boa performance.

Os resultados da empresa nunca foram dos melhores devido, em parte, ao fato de ela voar principalmente em rotas disputadas por Latam e Gol. A Gol foi a primeira companhia nacional a adotar um modelo de negócio de custo baixo, obrigando a Latam a ir por um caminho semelhante. Com aviões novos, mais eficientes e alta utilização da frota (em média voando 12 horas por dia, quando a média nacional era de 7 horas), a Gol estreou no mercado com um custo 40% inferior ao da Varig e da então TAM (hoje Latam). A Varig quebrou ao resistir ao corte de custos. A TAM se salvou justamente por fazê-lo – eliminou, mais recentemente, até a tradicional balinha de boas-vindas.

Competição

Gol e Latam se tornaram, assim, muito competitivas – o que tem dificultado a entrada de novas companhias no setor e feito novatas quebrarem no caminho, diz o especialista no setor aéreo André Castellini, sócio da consultoria Bain & Company.

Para tentar ganhar passageiros em rotas dominadas pelas concorrentes, a Avianca apostou em preços inferiores para passagens compradas de última hora, apesar de oferecer um serviço muitas vezes superior – e mais caro –, como comida quente e espaço maior entre poltronas. A estratégia poderia funcionar para ganhar participação de mercado, mas não era sustentável no longo prazo.

A Azul foi a única que conseguiu, até agora, entrar com sucesso no setor dominado por Latam e Gol. A receita foi fugir das rotas nas quais as duas estão presentes. Ajudou também o fato de ela começar a crescer quando a crise dava os primeiros sinais, obrigando Latam e Gol a focarem nas próprias operações, e não na concorrente. A questão é que atuar no mercado secundário é mais caro. Entrar no segmento da Azul tem, portanto, um desafio extra para uma possível nova estreante. 

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Luciana Dyniewicz - O Estado de S.Paulo

06 de maio de 2019 | 13h13

O ponto de equilíbrio entre demanda e oferta tem sido um dos grandes desafios das companhias aéreas no Brasil e no exterior. Lá fora, para escaparem da falência, Delta, American Airlines e United reduziram suas frotas. Assim, elas conseguiram elevar os preços das passagens e sair da crise em que haviam mergulhado nos anos 2000 – ajudaram também na recuperação uma pressão sobre as arrendadoras de aeronaves para que os contratos fossem renovados com preços menores e o apoio por parte de empresas parceiras, como os bancos.

Uma empresa aérea quebra a cada dois anos no País

Por aqui, Avianca não conseguiu sobreviver a crise de 2015 e 2016 e as companhias que restaram entram agora em um nova fase da disputa. Diante da saída dela do mercado, Gol, Latam e Azul começam a ampliar suas frotas, que haviam encolhido durante a recessão. A intenção é ocupar o espaço deixado pela Avianca e avançar ainda mais com a possível recuperação da economia e com os juros baixos.

Avianca não cortou oferta na crise de 2015 e 2016 Foto: Carlos Garcia Rawlins/Reuters

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“O setor está na iminência de viver um novo ciclo benigno. A esperança é que agora seja diferente (do início desta década, quando as empresas entraram numa guerra de preços baixos para ganhar mercado). Todas as companhias são de capital aberto e precisam remunerar o investidor. Será que as três vão inundar o mercado (com oferta) de novo?”, questiona um executivo do setor.

A preocupação é que a maior oferta de voos acabe reduzindo os preços e pressionando as margens, que frequentemente não passam de 10%. A Gol, porém, registrou 17% no primeiro trimestre, indício de que uma fase melhor está começando. A sensibilidade do consumidor em relação ao preço das passagens explica as margens – hoje, o passageiro escolhe a companhia principalmente pelo preço do bilhete aéreo.

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Luciana Dyniewicz - O Estado de S.Paulo

06 de maio de 2019 | 12h08

Com passagem por três empresas aéreas que quebraram – Vasp, Transbrasil e Varig –, o engenheiro de voo Luciano Mantovani, de 52 anos, já não vê futuro na aviação comercial. “É praxe no Brasil as companhias aéreas quebrarem. Os encargos são elevados, dificultam a operação”, diz. “Trabalhar nessa área é para quem não tem família. Não há confiança de que se vai ter futuro”, acrescenta ele, que tem R$ 62,4 mil para receber da massa valida da Varig. Decepcionado com o setor, Mantovani trabalha hoje no controle de voo de helicópteros que pousam em navios.

Uma empresa aérea quebra a cada dois anos no País

Mantovani tem R$ 62,4 mil da Varig para receber Foto: Gilmar Gomes/Estadão

Também desapontado, um despachante de voo que pediu para não se identificar conta pensar em mudar de profissão – após ter trabalhado na Varig (“até poucos meses antes de ela parar”), na BRA (“até o fim”) e na Avianca Brasil. “Estou me cadastrando em sites, tentando me realocar, mas, se não conseguir, vou mudar de área. O problema é que a profissão é muito específica. É difícil uma empresa de outro setor aceitar um profissional como eu”, conta ele, que era responsável pelo planejamento de voos da Avianca e foi demitido na quinta-feira sem receber informações sobre os pagamentos devidos.

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Segundo o Sindicato dos Aeroviários de Guarulhos, no aeroporto da cidade, 70 funcionários da Avianca foram dispensados entre dezembro e abril. Apenas na quinta-feira, outros 67 foram demitidos – restavam 167. O primeiro grupo de trabalhadores a deixar a empresa conseguiu receber as verbas rescisórias, ainda que com atraso.

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04 de maio de 2019 | 18h37

Um leilão marcado para ocorrer na terça-feira, 7, em um edifício próximo à Avenida Paulista, em São Paulo, colocará fim a mais uma companhia aérea brasileira. A Avianca Brasil será a 11.ª empresa do setor a encerrar as operações desde 2001 no País, que tem taxa de mortalidade de uma empresa a cada dois anos. 

Desafio de companhias aéreas é equilibrar oferta e demanda

Os casos de falência ou de recuperação judicial na aviação não são exclusividade do Brasil. Neste ano, outras nove empresas aéreas endividadas deixaram de voar no mundo, desde pequenas, como a sul-coreana AirPhilip, até companhias mais relevantes, como a Jet Airways, que chegou a ser uma das maiores da Índia. Nos EUA, American Airlines, Delta e United já tiveram de recorrer ao Chapter 11, o equivalente à recuperação judicial brasileira, mas acabaram sobrevivendo. 

A operação internacional da Avianca queimou rapidamente o caixa da companhia, que já não tinha boa performance Foto: Carlos Garcia Rawlins/Reuters

Margens baixas, necessidade de injeções volumosas de capital, contratos de longo prazo com arrendadoras de aeronaves e vulnerabilidade ao preço do combustível – e ao dólar, no caso brasileiro – estão entre os fatores que explicam a elevada taxa de mortalidade.

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Empresas aéreas brasileiras que quebraram ou entraram em recuperação judicial

Nota: *Saiu da recuperação em 2017

Fonte: Abear e André Castellini

Foram basicamente duas dessas decisões que tornaram a situação da Avianca insustentável nos últimos anos, segundo analistas. Uma delas foi a de não enxugar a frota em 2015 e 2016, período mais delicado da aviação brasileira desde os anos 2000. Foram nesses anos que a crise econômica derrubou a demanda por transporte aéreo e os custos foram pressionados pela alta do dólar e do petróleo.

Nessa época, muitos apostaram que a Gol seria a primeira a sucumbir – dado seu nível de endividamento –, mas uma renegociação com credores, aliada a um plano de devolução de aeronaves, garantiu a virada do jogo. Latam e Azul fizeram movimentos semelhantes em suas frotas e contaram ainda com novos recursos – a primeira vendeu uma participação para a Qatar e a segunda abriu capital. A Avianca, porém, não recuou no número de aeronaves, em uma tentativa de ganhar participação de mercado.

Outra decisão equivocada foi a entrada no mercado internacional, em 2017. Um voo para o exterior tem um custo médio dez vezes superior ao de um doméstico. Se o avião não sai lotado, portanto, o prejuízo é grande. A operação internacional da Avianca queimou rapidamente o caixa da companhia, que já não tinha boa performance.

Os resultados da empresa nunca foram dos melhores devido, em parte, ao fato de ela voar principalmente em rotas disputadas por Latam e Gol. A Gol foi a primeira companhia nacional a adotar um modelo de negócio de custo baixo, obrigando a Latam a ir por um caminho semelhante. Com aviões novos, mais eficientes e alta utilização da frota (em média voando 12 horas por dia, quando a média nacional era de 7 horas), a Gol estreou no mercado com um custo 40% inferior ao da Varig e da então TAM (hoje Latam). A Varig quebrou ao resistir ao corte de custos. A TAM se salvou justamente por fazê-lo – eliminou, mais recentemente, até a tradicional balinha de boas-vindas.

Competição

Gol e Latam se tornaram, assim, muito competitivas – o que tem dificultado a entrada de novas companhias no setor e feito novatas quebrarem no caminho, diz o especialista no setor aéreo André Castellini, sócio da consultoria Bain & Company.

Para tentar ganhar passageiros em rotas dominadas pelas concorrentes, a Avianca apostou em preços inferiores para passagens compradas de última hora, apesar de oferecer um serviço muitas vezes superior – e mais caro –, como comida quente e espaço maior entre poltronas. A estratégia poderia funcionar para ganhar participação de mercado, mas não era sustentável no longo prazo.

A Azul foi a única que conseguiu, até agora, entrar com sucesso no setor dominado por Latam e Gol. A receita foi fugir das rotas nas quais as duas estão presentes. Ajudou também o fato de ela começar a crescer quando a crise dava os primeiros sinais, obrigando Latam e Gol a focarem nas próprias operações, e não na concorrente. A questão é que atuar no mercado secundário é mais caro. Entrar no segmento da Azul tem, portanto, um desafio extra para uma possível nova estreante. 

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Uma empresa aérea quebra a cada dois anos no País

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Avianca não cortou oferta na crise de 2015 e 2016 Foto: Carlos Garcia Rawlins/Reuters

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A preocupação é que a maior oferta de voos acabe reduzindo os preços e pressionando as margens, que frequentemente não passam de 10%. A Gol, porém, registrou 17% no primeiro trimestre, indício de que uma fase melhor está começando. A sensibilidade do consumidor em relação ao preço das passagens explica as margens – hoje, o passageiro escolhe a companhia principalmente pelo preço do bilhete aéreo.

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Uma empresa aérea quebra a cada dois anos no País

Mantovani tem R$ 62,4 mil da Varig para receber Foto: Gilmar Gomes/Estadão

Também desapontado, um despachante de voo que pediu para não se identificar conta pensar em mudar de profissão – após ter trabalhado na Varig (“até poucos meses antes de ela parar”), na BRA (“até o fim”) e na Avianca Brasil. “Estou me cadastrando em sites, tentando me realocar, mas, se não conseguir, vou mudar de área. O problema é que a profissão é muito específica. É difícil uma empresa de outro setor aceitar um profissional como eu”, conta ele, que era responsável pelo planejamento de voos da Avianca e foi demitido na quinta-feira sem receber informações sobre os pagamentos devidos.

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Segundo o Sindicato dos Aeroviários de Guarulhos, no aeroporto da cidade, 70 funcionários da Avianca foram dispensados entre dezembro e abril. Apenas na quinta-feira, outros 67 foram demitidos – restavam 167. O primeiro grupo de trabalhadores a deixar a empresa conseguiu receber as verbas rescisórias, ainda que com atraso.

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